1. À Primeira Vista

 
Essa era a hora do dia em que eu desejava poder dormir. Segundo grau.
Ou será que a palavra certa era purgatório? Se houvesse uma maneira de conciliar os meus pecados, isso devia contar no ajuste de alguma forma. O tédio não era uma coisa com a qual eu me acostumei; cada dia parecia mais impossivelmente monótono do que o último.
Eu acho que essa era a minha forma de dormir – se dormir era definido como um estado de inércia entre períodos ativos.
Eu olhei para as rachaduras no gesso no canto mais distante do refeitório, imaginando padrões por dentro deles que não estavam lá. Essa era a única forma de desconectar as vozes que tagarelavam como o jorro de um rio dentro da minha cabeça.
Várias centenas de vozes que eu ignorava por pura chateação.
Quando se tratava da mente humana, eu já tinha ouvido tudo e mais um pouco. Hoje, todos os pensamentos estavam sendo consumidos com o drama comum de uma nova adição ao pequeno corpo estudantil daqui. Não levou muito tempo para ouvir todos eles. Eu havia visto o rosto se repetindo em pensamento após pensamento sob todos os ângulos. Só uma garota humana normal. A excitação pela chegada dela era cansativamente previsível – como um objeto brilhante para um criança. Metade do corpo estudantil masculino já estava se imaginando apaixonado por ela, só porque ela era algo novo pra se olhar. Eu tentei desconectá-los mais ainda.
 
Só havia quatro vozes que eu bloqueava mais por cortesia do que por desgosto: minha família, meus dois irmãos e duas irmãs, que já estavam tão acostumados com a falta de privacidade quando estavam ao meu lado que já nem pensavam nela. Eu dava a eles toda a privacidade que podia. Eu tentava não ouvi-los, se podia.
Mesmo tentando, ainda assim… eu sabia.
Rosalie estava pensando, como sempre, nela mesma. Ela havia visto o reflexo do seu perfil no copo de alguém, e ela estava meditando sobre a sua própria perfeição. A mente de Rosalie era uma piscina rasa com poucas surpresas.
Emmett estava espumando por causa de uma luta que ele havia perdido para Jasper na noite passada. Ele iria usar toda a sua limitada paciência pra chegar até o fim do dia escolar e orquestrar uma revanche. Eu nunca me senti muito intrusivo ouvindo os pensamentos de Emmett, porque ele nunca pensava em alguma coisa que ele não diria em voz alta ou fizesse. Talvez eu só me sentisse culpado lendo as mentes dos outros porque eu sabia que havia coisas que eles não iriam querer que eu soubesse.
Se a mente de Rosalie era uma piscina rasa, então a de Emmett era uma lagoa sem sombras, clara como cristal.
E Jasper estava… sofrendo. Eu segurei um suspiro.
Edward. Alice chamou meu nome em sua cabeça, e chamou minha atenção imediatamente. Era exatamente como se ela estivesse chamando o meu nome em voz alta. Eu ficava feliz que o nome que me foi dado havia saído um pouco de moda ultimamente – isso era incômodo; toda vez que alguém pensava em um Edward qualquer, minha cabeça se virava automaticamente…
Minha cabeça não se virou agora. Alice e eu éramos bons nessas conversas privadas. Era raro quando alguém nos flagrava. Eu mantive meus olhos nas linhas do gesso.
Como ele está agüentando?, ela perguntou para mim.
Eu fiz uma careta só com um pequeno movimento da minha boca. Nada que pudesse alertar os outros. Eu podia facilmente estar fazendo uma careta de chateação.
O tom mental de Alice estava alarmado agora, eu vi na mente dela que ela estava observando Jasper com a sua visão periférica. Há algum perigo? Ela procurou à frente, no futuro imediato, vasculhando por visões de monotonia para a fonte da minha careta. Eu virei minha cabeça lentamente para a esquerda, como se estivesse olhando para os tijolos na parede, suspirei, e depois para a direita, de volta para as rachaduras no teto. Só Alice sabia que eu estava balançando a minha cabeça.
Ela relaxou. Me avise se piorar.
Eu mexi apenas os meus olhos para cima, para o teto, e pra baixo de novo.
Obrigada por estar fazendo isso.
Eu estava feliz por não poder respondê-la em voz alta. O que eu iria dizer? ‘O prazer é meu’? Não era bem assim. Eu não gostava de ouvir as lutas de Jasper. Era mesmo necessário fazer experiências como essas? Será que o caminho mais seguro não seria admitir que ele jamais seria capaz de lidar com a sede do jeito que nós fazíamos, e não forçar os limites dele? Pra quê flertar com o desastre?
Já fazia duas semanas desde a nossa última viagem de caça. Esse não era um tempo imensamente difícil para o resto de nós. Ocasionalmente era um pouco desconfortável – se um humano se aproximasse demais, se o vento soprasse na direção errada. Mas os humanos raramente se aproximavam demais. Seus instintos diziam a eles o que suas mentes conscientes não podiam entender: nós éramos perigosos.
Jasper era muito perigoso nesse momento.
Nesse momento, uma garota pequena pausou na ponta da mesa mais próxima da nossa, parando para falar com uma amiga. Ela alisou o seu cabelo curto, cor de areia, passando os dedos por ele. Os aquecedores jogaram o cheiro na nossa direção. Eu já estava acostumado ao jeito que esse cheiro me fazia sentir – a dor seca na minha garganta, o grito vazio no meu estômago, a contração automática dos meus músculos, o excesso do fluxo de veneno na minha boca…
Tudo isso era muito normal, geralmente fácil de ignorar. Só que era mais difícil agora, com esses sentimentos mais fortes, duplicados, enquanto eu monitorava a reação de Jasper. Era uma sede gêmea, não apenas a minha.
Jasper estava deixando a sua imaginação se separar dele. Ele estava imaginando isso – se imaginando levantando do lugar dele ao lado de Alice e indo ficar ao lado da garota. Pensando em se inclinar pra baixo e pra frente, como se ele fosse falar no ouvido dela, e deixando seus lábios tocarem o arco da garganta dela. Imaginando como seria a sensação de sentir o fluxo quente do pulso dela por baixo de sua pele fina na boca dele…
Eu chutei a cadeira dele.
Ele me olhou nos olhos por um minuto e depois olhou para baixo. Eu podia ouvir a vergonha e a rebeldia guerreando na cabeça dele.
- Desculpe – Jasper murmurou.
Eu levantei os ombros.
- Você não ia fazer nada – Alice murmurou pra ele, acalmando seu pesar. – Eu podia ver.
Eu lutei contra a careta que teria denunciado a mentira dela. Nós tínhamos que permanecer juntos, Alice e eu. Não era fácil ouvir vozes ou ter visões do futuro. Duas aberrações no meio daqueles que já eram aberrações. Nós protegíamos os segredos um do outro.
- Ajuda um pouco se você pensar neles como seres humanos – Alice sugeriu, sua voz alta, musical, era rápida demais para os ouvidos humanos entenderem, se algum deles estivesse perto o suficiente pra ouvir. – O nome dela é Whitney. Ela tem uma irmãzinha que ela adora. A mãe dela convidou Esme para a aquela festa de jardim, você se lembra?
- Eu sei quem ela é – Jasper disse curtamente. Ele se virou pra olhar por uma das pequenas janelas que eram colocadas bem embaixo das vigas pela grande sala. O tom dele acabou com a conversa.
Ele teria que caçar hoje à noite. Era ridículo se arriscar desse jeito, tentando testar sua força, tentando construir sua resistência. Jasper deveria simplesmente aceitar suas limitações e trabalhar com elas. Seus hábitos antigos não condizia com os hábitos que nós escolhemos; ele não devia exigir tanto de si mesmo desse jeito.
Alice suspirou baixinho e se levantou, levando sua bandeja de comida – seu adereço, isso é que era – com ela e deixando-o sozinho. Ela sabia quando ele já estava de saco cheio dos encorajamentos dela. Apesar de Rosalie e Emmett serem mais abertos em relação ao relacionamento deles, eram Alice e Jasper que conheciam cada traço do humor do outro como o seu próprio. Como se eles pudessem ler mentes também – só que só um do outro.
Edward Cullen.
Reação por reflexo. Eu me virei com o som do meu nome sendo chamado, apesar de ele não estar sendo chamado, só pensado.
Meus olhos se prenderam por uma pequena fração de segundo com um grande par de olhos humanos, cor de chocolate num rosto pálido, com formato de coração. Eu já conhecia o rosto, apesar de nunca tê-lo visto até esse momento. Ele esteve em quase todas as cabeças humanas hoje. A nova estudante, Isabella Swan. Filha do chefe de polícia da cidade, trazida pra viver aqui por uma nova situação de custódia. Bella. Ela corrigia todo mundo que usava o seu nome inteiro…
Eu desviei o olhar, enfadado. Eu levei um segundo para me dar conta de que não fora ela quem pensou no meu nome.
É claro que ela já está se apaixonando pelos Cullen, eu ouvi o primeiro pensamento continuar.
Agora eu reconhecia a “voz”. Jéssica Stanley – já fazia um tempo que ela me incomodava com as suas tagarelices internas. Foi um alívio quando ela se curou da sua paixão deslocada. Era quase impossível escapar dos seus constantes, ridículos sonhos diurnos. Eu desejei, naquele tempo, poder explicar exatamente o que teria acontecido seu os meus lábios, e os dentes atrás deles, chegassem em algum lugar perto dela. Isso teria silenciado aquelas fantasias incômodas. O pensamento da reação dela quase me fez sorrir.
Grande bem que vai fazer para ela, Jessica continuou. Ela não é nem bonita. Eu não sei por que Eric está olhando tanto pra ela… ou Mike. Ela suspirou mentalmente no último nome. A nova paixão dela, o genericamente popular Mike Newton, era completamente inconsciente dela. Aparentemente, ele não era tão inconsciente sobre a garota nova. Como a criança com o objeto brilhante de novo.
Isso colocou uma pontada maligna nos pensamentos de Jessica, apesar de ela ser externamente cordial com a recém-chegada enquanto explicava os conhecimentos comuns sobre a minha família. A nova estudante deve ter perguntado sobre nós.
Hoje todos estão olhando pra mim também, Jessica pensou presumidamente em um aparte. É uma sorte que Bella tenha duas aulas comigo… eu aposto que Mike vai perguntar o que ela…
Eu tentei bloquear a tagarela antes que a mesquinharia e a insignificância me deixassem louco.
- Jessica Stanley está dando à nova garota Swan todos os podres do clã Cullen – eu murmurei pra Emmett como distração. Ele gargalhou por debaixo do fôlego. Eu espero que ela esteja fazendo isso direito, ele pensou.
- Na verdade, muito pouco criativo. Só a pequena ponta do escândalo. Nenhuma fofoca horrorosa. Eu estou um pouco desapontado.
E a garota nova? Ela também está desapontada com a fofoca?
Eu tentei escutar o que essa nova garota, Bella, estava pensando das histórias de Jéssica. O que ela via quando olhava para a estranha família com peles pálidas que era universalmente evitada?
Era meio que a minha obrigação saber a reação dela. Eu agia como um espião, por falta de uma palavra melhor, para a minha família. Para nos proteger. Se alguém começasse a suspeitar, eu podia nos dar a chance de ter um aviso prévio para nos retirarmos facilmente. Isso acontecia ocasionalmente – algum humano com uma mente ativa nos via como personagens de um livro ou um filme. Geralmente eles entendiam tudo errado, mas era melhor nos mudarmos pra algum lugar novo do que arriscarmos o escrutínio. Muito, muito raramente, alguém adivinhava corretamente.
Nós não dávamos a eles uma chance de testar suas hipóteses. Nós simplesmente desaparecíamos, para nos tornarmos nada além de uma memória assustadora…
Eu não ouvi nada, apesar de ouvir onde a tagarelice frívola de Jessica continuava jorrando ali perto. Era como se não houvesse ninguém sentado ao lado dela. Que peculiar, será que a garota nova tinha ido embora? Não parecia provável, já que Jessica continuava fofocando com ela. Eu olhei pra cima pra checar, me sentindo meio desequilibrado. Checar o que os meus “ouvidos” extras podiam me dizer não era uma coisa que eu tinha que fazer.
De novo, os meus olhos se prenderam naqueles mesmos grandes olhos marrons.
Ela estava sentada lá exatamente como antes, olhando pra nós, uma coisa natural a se fazer, eu acho, já que Jessica ainda estava espalhando as fofocas locais sobre os Cullen.
Pensar em nós também seria natural.
Mas eu não ouvia nem um sussurro. Um quente e convidativo vermelho coloriu suas bochechas quando ela olhou para baixo, desviando o olhar da embaraçosa gafe de ser pega encarando um estranho. Era bom que Jasper ainda estivesse olhando para a janela. Eu não gostava de imaginar o que aquele simples agrupamento de sangue faria com o controle dele.
As emoções estavam tão claras como se elas tivessem sido palavras saindo pela testa dela: surpresa, enquanto ela, sem saber, absorvia as diferenças entre a espécie dela e a minha; curiosidade, enquanto ela escutava os contos de Jessica; e algo mais… fascínio? Não seria a primeira vez. Nós éramos lindos pra eles, a nossa presa.
E depois, finalmente, vergonha, quando eu a flagrei me encarando.
E, mesmo assim, apesar dos seus pensamentos serem tão claros através dos seus olhos estranhos – estranhos por causa da profundidade deles; olhos marrons freqüentemente pareciam vazios em sua escuridão -, eu não conseguia ouvir nada além do silêncio vindo do lugar onde ela estava sentada. Absolutamente nada.
Eu senti um momento de intranqüilidade.
Isso não era uma coisa pela qual eu já tinha passado antes. Havia algo errado comigo? Eu me sentia exatamente do jeito que me sentia sempre. Preocupado, eu tentei escutar mais.
Todas as vozes que eu estive bloqueando estavam gritando na minha cabeça de repente.
…me pergunto de que música ela gosta… talvez eu possa mencionar aquele CD novo…, Mike Newton estava pensando, a duas mesas de distância – fixado em Bella Swan.
Olha ele olhando pra ela. Será que já não é suficiente que ele tenha metade das garotas da escola esperando que ele?, Eric Yorkie estava tendo pensamentos sofríveis, também girando ao redor da garota.
…tão nojento. Daria pra pensar que ela é famosa ou alguma coisa assim… Até Edward CULLEN está olhando… Lauren Mallory estava tão enciumada que o rosto dela, de todas as formas, devia estar com uma cor verde como a de jade. E Jessica, ostentando a sua nova melhor amiga. Que piada…, a garota continuou soltando veneno com os pensamentos.
…Eu aposto que todo mundo já deve ter perguntado isso a ela. Mas eu gostaria de falar com ela. Eu vou pensar em uma pergunta mais original…, Ashley Dowling meditou.
…Talvez ela esteja comigo em Espanhol…, June Richardson esperou.
…Toneladas de coisas para fazer essa noite! Trigonometria e o teste de inglês. Eu espero que a minha mãe… Angela Weber, uma garota tímida, cujos pensamentos eram anormalmente gentis, era a única na mesa que não estava obcecada com essa Bella.
Eu conseguia ouvir todos eles, ouvir cada coisinha insignificante que eles pensavam enquanto os pensamentos passavam em suas mentes. Mas absolutamente nada vinha da nova estudante com olhos enganosamente comunicativos.
E, é claro, eu conseguia ouvir o que a garota dizia quando ela falava com Jessica. Eu não precisava ouvir pensamentos pra ouvir sua voz baixa, clara, no outro lado da sala.
- Quem é o garoto com o cabelo marrom avermelhado? – eu a ouvi perguntar, dando uma olhadinha pelo canto dos olhos, só pra desviar rapidamente quando viu que eu ainda estava encarando-a.
Se eu tivesse tempo pra esperar que o som da voz dela pudesse me ajudar a conectar seus pensamentos, que estava perdidos em algum lugar onde eu não podia acessá-los, eu ficaria instantaneamente desapontado. Geralmente, os pensamentos das pessoas vinham acompanhados por um lance diferente em suas vozes físicas. Mas essa voz baixa, tímida, não era familiar, não era nenhuma das centenas de vozes rodeando a sala, eu tinha certeza disso. Ela era inteiramente nova.
Oh, boa sorte, idiota!, Jessica pensou antes de responder à pergunta da garota.
- Aquele é Edward. Ele é deslumbrante, é claro, mas não perca o seu tempo. Ele não namora. Aparentemente nenhuma das garotas daqui é bonita o suficiente pra ele. – Ela fungou.
Eu virei minha cabeça para esconder um sorriso. Jessica e as amigas dela não tinha idéia de quanta sorte elas tinham por nenhuma delas ser particularmente apelativa pra mim.
Por baixo do humor passageiro, eu senti um estranho impulso, um que eu não entendia claramente. Tinha alguma coisa a ver com os pensamentos maldosos de Jessica, dos quais a garota nova não estava consciente… Eu senti uma estranha urgência de me meter entre elas, para proteger essa Bella Swan dos trabalhos obscuros da mente de Jessica. Que coisa estranha a se sentir. Tentando entender as motivações por trás desse impulso, eu examinei a garota nova mais uma vez. Talvez fosse algum instinto de proteção que estava há muito tempo enterrado – o mais forte pelo mais fraco. Essa garota parecia mais frágil do que as suas novas colegas de classe. A pele dela era tão translúcida que era difícil de acreditar que ela oferecia alguma resistência contra o mundo exterior. Eu podia ver o ritmo da pulsação do sangue através das suas veias, debaixo da sua membrana clara, pálida… Mas eu não deveria me concentrar. Eu era bom nessa vida que eu havia escolhido, mas eu estava com tanta sede quanto Jasper e era melhor não convidar a tentação.
Havia uma fraca linha entre as suas sobrancelhas da qual ela não parecia ter consciência.
Isso era inacreditavelmente frustrante! Eu podia ver claramente que ela estava tensa por ter que sentar aqui, ter que conversar com estranhos, ser o centro das atenções.
Eu podia sentir a sua timidez pelo jeito como ela segurava seus ombros de aparência frágil, levemente espremidos, como se ela estivesse esperando ser empurrada a qualquer momento. E, mesmo assim, eu só podia sentir, só podia ver, só podia imaginar. Não havia nada além de silêncio vindo dessa garota humana muito normal.
Eu não conseguia ouvir nada. Por quê?
- Vamos? – Rosalie murmurou, interrompendo minha concentração. Eu desviei o olhar da garota com uma sensação de alívio. Eu não queria continuar falhando nisso – isso me irritava. Eu não queria desenvolver nenhuma espécie de interesse especial pelos seus pensamentos simplesmente porque eles estavam escondidos de mim. Sem dúvida, quando eu decifrasse seus pensamentos – e eu ia encontrar uma forma de fazer isso – eles seriam exatamente tão insignificantes e triviais quanto os pensamentos de qualquer humano. Eles não valeriam o esforço que eu faria para alcançá-los.
- Então, a novata já está com medo de nós? – Emmett perguntou, ainda esperando pela resposta à sua pergunta anterior.
Eu levantei os ombros. Ele não estava interessado o suficiente pra me pressionar por mais informações. Eu também não deveria estar interessado.
Nós nos levantamos da mesa e saímos do refeitório.
Emmett, Rosalie e Jasper estavam fingindo estar no último ano; eles foram para as aulas deles. Eu estava fingindo ser mais novo que eles. Eu fui para a minha aula de Biologia do nível médio, preparando a minha mente para o tédio. Era duvidoso que o Sr. Banner, um homem com uma inteligência não mais que comum, pudesse tirar da sua aula alguma coisa que pudesse surpreender alguém que já tinha dois graus de graduação em medicina.
Na sala de aula, eu sentei na minha cadeira e deixei meus livros – adereços de novo; eles não continham nada que eu já não soubesse – espalhados pela mesa. Eu era o único aluno que tinha uma mesa só pra si. Os humanos não eram espertos o suficiente pra saber que eles tinham medo de mim, mas seus instintos de sobrevivência eram suficientes pra mantê-los afastados de mim.
A sala foi se enchendo lentamente enquanto eles voltavam do almoço. Eu me inclinei na minha cadeira e esperei o tempo passar. De novo, eu desejei ser capaz de dormir.
Como eu estava pensando nela, quando Angela Weber acompanhou a garota nova pela porta, o nome dela chamou minha atenção.
Bella parece ser tão tímida quanto eu. Eu aposto que hoje foi muito difícil pra ela. Eu queria poder dizer alguma coisa… Mas provavelmente eu só ia parecer uma estúpida…
Isso! Mike Newton se virou em sua cadeira pra observar a entrada da garota.
Ainda, do lugar onde Bella estava, nada. O espaço vazio onde os pensamentos dela deveriam estar me deixou irritado e enervado.
Ela se aproximou, passando pelo corredor ao meu lado para chegar à mesa do professor.
Pobre garota; o lugar ao meu lado era o único que estava vazio.
Automaticamente eu limpei aquele que seria o lado dela da mesa, colocando os meus livros numa pilha. Eu duvidava que ela fosse se sentir muito confortável aqui. Ela teria que agüentar um longo semestre – nessa aula, pelo menos. Talvez, no entanto, me sentando ao lado dela, eu fosse capaz de desvendar os seus segredos… não que eu já tivesse precisado de tanta proximidade antes… não que eu fosse encontrar alguma coisa que valesse a pena escutar…
Bella Swan caminhou para o fluxo do ar aquecido que soprava na minha direção do aquecedor.
O cheiro dela me atingiu como uma bola, como um bastão de jogo. Não há nenhuma imagem violenta o suficiente para encapsular a força do que aconteceu comigo naquele momento.
Naquele instante, eu não era nada nem perto do humano que um dia eu fui, nenhum traço da humanidade na qual eu estive tentando me esconder.
Eu era um predador. E ela era a minha presa. Não havia nada mais nesse mundo além desse verdade.
Não havia uma sala lotada de testemunhas – na minha cabeça eles já eram uma avaria colateral. O mistério dos pensamentos dela estava esquecido. Os pensamentos dela não significavam nada, ela não iria passar muito mais tempo pensando.
Eu era um vampiro e ela era o sangue mais doce que eu havia cheirado em oitenta anos.
Eu nunca imaginei que um cheiro assim pudesse existir. Se eu soubesse que existia, eu já teria saído procurando há muito tempo. Eu teria vasculhado o planeta por ela. Eu podia imaginar o sabor…
A sede queimou a minha garganta como fogo. Minha boca estava torrada e desidratada. O fluxo fresco de veneno não fez nada para dissipar essa sensação. Meu estômago revirou com o fome que era um eco da sede. Meus músculos se contraíam e descontraíam.
Nem um segundo havia se passado. Ela ainda estava andando no mesmo passo que a havia colocado no vento em minha direção.
Enquanto os pés dela tocavam o chão, seus olhos escorregaram na minha direção. Um movimento que ela claramente estava esperando que fosse furtivo. O olhar dela encontrou o meu, e eu me vi refletido no grande espelho dos seus olhos.
O choque pelo rosto que eu vi lá salvou a vida dela por mais alguns momentos. Ela não facilitou as coisas. Quando ela viu a expressão no meu rosto, o sangue apareceu nas bochechas dela de novo, deixando a pele dele com a cor mais deliciosa que eu já havia visto. O cheiro era uma grossa neblina no meu cérebro. Eu mal conseguia pensar através dela.
Meus pensamentos se enfureceram, resistindo ao controle, incoerentes.
Agora ela caminhava mais rapidamente, como se ela entendesse que precisava escapar. A pressa dela a deixou desastrada – ela tropeçou e se inclinou para a frente, quase caindo na garota que se sentava na minha frente. Vulnerável, fraca. Até mais que o normal para um humano.
Eu tentei me concentrar no rosto que havia visto nos olhos dela, um rosto que eu reconhecia com nojo. O rosto do monstro em mim – o rosto que eu havia afastado com décadas de esforço e disciplina inflexível. Como ele voltara à superfície com facilidade agora!
O cheiro me invadiu novamente, ferindo os meus pensamentos e quase me fazendo pular do meu lugar.
Não.
Minha mão se agarrou à beirada da mesa enquanto eu tentava me segurar na cadeira.
A madeira não ajudou na tarefa. Minha mão quebrou a estrutura e escapuliu, cheia de restos de fuligem, deixando a marca dos meus dedos cravadas na madeira que restou.
Destruir as provas. Essa era a regra fundamental.
Eu rapidamente pulverizei as beiradas com as pontas dos dedos, sem deixar nada além de um buraco e uma pilha de fuligem no chão, que eu limpei com o meu pé.
Destruir as provas. Avarias colaterais…
Eu sabia o que tinha que acontecer agora. A garota teria que vir se sentar ao meu lado e eu teria que matá-la.
Os inocentes espectadores na sala, outras dezoito crianças e um homem, não poderiam mais ter permissão de sair dessa sala, tendo visto o que eles veriam em breve.
Eu enrijeci com o pensamento do que eu precisava fazer. Mesmo em meus piores dias, eu nunca havia cometido esse tipo de atrocidade. Eu nunca matei inocentes em nenhuma desses oito décadas. E agora eu planejava matar vinte deles de uma só vez.
O rosto do monstro no espelho zombou de mim.
Mesmo com parte de mim se afastando desse monstro, a outra parte estava fazendo planos.
Se eu matasse a garota primeiro, eu só teria uns quinze ou vinte segundos com ela antes que os outros humanos na sala começassem a reagir. Talvez um pouco mais de tempo, se eles não percebessem logo no início o que eu estava fazendo. Ela não teria tempo de gritar ou de sentir dor; eu não ia matá-la cruelmente. Pelo menos isso eu podia dar à essa estranha com sangue horrivelmente desejável.
Mas depois eu teria que impedi-los de escapar. Eu não precisaria me preocupar com as janelas, elas eram altas e pequenas demais para servir como escapatória pra alguém. Só a porta – a bloqueie e eles ficarão presos.
Seria mais lento e difícil tentar matar todos eles quando estivessem em pânico e se misturando, se movimentando no caos. Nada impossível, mas haveria muito mais barulho. Daria tempo para muitos gritos. Alguém poderia ouvir… e eu seria obrigado a matar ainda mais inocentes nessa hora negra.
E o sangue dela iria esfriar enquanto eu estivesse assassinando os outros.
O cheiro me castigou, fechando a minha garganta com uma dor seca…
Então seriam as testemunhas primeiro.
Eu planejei tudo na minha cabeça. Eu estaria no meio da sala, na fila mais afastada do fundo. Eu pegaria o lado direito primeiro. Eu podia morder quatro ou cinco pescoços por segundo, eu estimei. Não seria barulhento. O lado direito seria o lado de sorte; eles não iriam me ver chegando. Me movendo pra frente e pra trás até a fila esquerda iria me levar, no máximo, cinco segundos pra acabar com todas as vidas nessa sala.
Tempo o suficiente pra Bella Swan ver, brevemente, o que estava esperando por ela. Tempo o suficiente para ela sentir medo. Tempo suficiente, talvez, se o choque não a congelasse no lugar, para ela tentar gritar. O gritinho suave não faria ninguém aparecer correndo.
Eu respirei fundo, e o cheiro era como um fogo correndo nas minhas veias secas, queimando por dentro do meu peito pra consumir qualquer impulso de bondade do qual eu ainda fosse capaz.
Ela estava se virando agora. Em alguns segundos, ela se sentaria a apenas alguns centímetros de mim.
O monstro na minha cabeça sorriu com a antecipação.
Alguém fechou um fichário ao meu lado. Eu não me virei pra ver qual dos humanos predestinados havia feito isso, mas o movimento mandou uma onda de vento sem cheiro na minha direção.
Por um curto segundo, eu fui capaz de pensar com clareza. Naquele precioso segundo, eu vi dois rostos na minha cabeça, lado a lado.
Um era o meu, ou o que ele foi um dia: o monstro de olhos vermelhos que já havia matado tantas pessoas que já havia parado de contar o número. Assassinatos racionalizados, justificados. Um assassino de assassinos, um assassino de outros monstros, menos poderosos. Era um complexo de ser Deus, eu sabia disso – decidir quem merecia uma sentença de morte. Era um compromisso comigo mesmo. Eu havia me alimentado de sangue humano, mas somente humanos em sua definição mais fraca. As minhas vítimas eram, em seus violentos dias negros, tão humanos quanto eu era.
O outro rosto era o de Carlisle.
Não havia nenhuma semelhança entre os dois rostos.
Eles eram como o dia mais claro e a noite mais escura. Não havia motivo pra que houvesse uma semelhança. Carlisle não era meu pai no sentido biológico básico. Nós não tínhamos feições semelhantes. A similaridade na nossa cor era apenas por causa do que éramos; todos os vampiros tinham a mesma cor pálida como gelo. A similaridade da cor dos nossos olhos era outra coisa – uma reflexão da nossa escolha mútua.
E, mesmo assim, apesar de não haverem bases pra uma semelhança, eu havia imaginado que o meu rosto havia começado a refletir o dele, até um certo ponto, nos últimos estranhos setenta anos em que eu abracei a escolha dele e segui os seus passos. O meu rosto não havia mudado, mas para mim parecia que alguma da sabedoria dela havia marcado a minha expressão, que um pouco da compaixão dele podia ser traçada nos contornos da minha boca, e que as suas sugestões de paciência estavam evidentes nas minhas sobrancelhas.
Todas essa pequenas melhorias estavam escondidas no rosto do monstro. Em alguns instantes, não haveria mais nada que pudesse refletir os anos que eu havia passado com o meu criador, o meu mentor, o meu pai em todas as formas que se podia contar.
Meus olhos brilhariam vermelhos como os do diabo; todas as semelhanças estariam perdidas pra sempre.
Na minha cabeça, os olhos bondosos de Carlisle não me julgavam. Eu sabia que ele me perdoaria por esse terrível ato que eu iria cometer. Porque ele me amava. Porque ele pensava que eu era melhor do que eu era de verdade. E ele continuaria me amando, mesmo agora, quando eu provasse que ele estava errado.
Bella Swan se sentou ao meu lado, seus movimentos eram rígidos e estranhos – com medo? -, e o cheiro do sangue dela criou uma inexorável nuvem ao meu redor.
Eu iria provar que meu pai estava errado sobre mim. A tristeza desse fato doía quase tanto quanto o fogo na minha garganta.
Eu me afastei dela com repulsa – revoltado com o monstro implorando pra atacá-la.
Por que ela tinha que vir para cá? Por que ela tinha que existir?
Por que ela tinha que acabar com o pouco de paz que eu tinha nessa minha não-vida? Por que essa humana agravante tinha que ter nascido? Ela ia me arruinar.
Eu desviei o meu rosto pra longe dela, enquanto uma súbita fúria, um aborrecimento irracional passou por mim.
Quem era essa criatura? Por que eu, por que agora? Por que eu tinha que perder tudo só porque ela escolheu aparecer nessa cidade improvável?
Por que ela tinha que vir pra cá?!
Eu não queria ser o monstro! Eu não queria matar essa sala cheia de crianças indefesas! Eu não queria perder tudo o que eu havia conseguido com uma vida inteira de sacrifícios e negações!
Eu não faria isso. Ela não ia me obrigar.
O cheiro era o problema, o cheiro odiosamente apelativo do sangue dela. Se houvesse alguma forma de resistir… se apenas um sopro de ar fresco pudesse limpar a minha cabeça.
Bella Swan balançou os seus longos, grossos cabelos cor de mogno na minha direção.
Ela era louca? Era como se ela estivesse encorajando o monstro! Cutucando-o.
Não havia nenhuma brisa amigável pra afastar o cheiro de mim agora. Tudo estaria perdido em breve.
Não, não havia nenhuma brisa amigável. Mas eu não precisava respirar. Eu parei o fluxo de ar para os meus pulmões; o alívio foi instantâneo, mas incompleto.
Eu ainda tinha a memória do cheiro na minha cabeça, o gosto no fundo da minha língua. Eu não seria capaz de resistir por muito mais tempo. Mas talvez eu pudesse resistir por uma hora. Uma hora. Só o tempo suficiente pra sair dessa sala cheia de vítimas, vítimas que talvez não precisassem ser vítimas. Se eu pudesse resistir durante uma curta hora.
Ficar sem respirar era uma sensação desconfortável. Meu corpo não precisava de oxigênio, mas isso ia contra os meus instintos. Eu me valia desse sentido muito mais do que em qualquer outro quando estava estressado. Ele me guiava nas caças, era o primeiro a me avisar em casos de perigo.
Eu não cruzava com alguma coisa tão perigosa quanto eu com freqüência, mas a auto-preservação era tão forte na minha espécie quanto nos humanos.
Desconfortável, mas suportável. Mais suportável do que sentir o cheiro dela e não afundar os meus dentes naquela pele bonita, fina, transparente, até o quente, molhado, pulsante ?
Uma hora! Só uma hora. Eu não devo pensar no cheiro, no gosto.
A garota silenciosa manteve o cabelo dela entre nós, se inclinando para a frente até que ele se espalhou no classificador dela. Eu não conseguia ver o seu rosto para tentar ler as emoções dela através de seus olhos claros, profundos. Era por isso que ela deixava as mechas entre nós? Para esconder aqueles olhos de mim? Por medo? Timidez? Para esconder seus segredos de mim?
A minha antiga irritação por ser incapacitado pelos seus pensamentos sem som era fraca e pálida em comparação à necessidade – e ao ódio – que me possuía agora. Eu odiava essa mulher-criança ao meu lado, a odiava com todas as forças que eu devotava ao meu antigo eu, meu amor pela minha família, meus sonhos de ser melhor do que eu era… Odiá-la, odiar o que ela me fazia sentir – isso ajudou um pouco.
Eu me agarrei a qualquer emoção que me distraísse do pensamento de qual seria o gosto dela…
Ódio e irritação. Impaciência. Será que essa hora não passaria nunca? E quando essa hora terminasse… Então ela sairia dessa sala. E eu faria o quê?
Eu podia me apresentar. Olá, meu nome é Edward Cullen. Posso te acompanhar até a sua próxima aula?
Ela diria sim. Era a coisa educada a se fazer. Mesmo já sentindo medo de mim, como eu suspeitava que ela sentisse, ela iria me acompanhar convencionalmente e caminhar ao meu lado. Seria fácil o suficiente guiá-la na direção errada.
Havia um pedaço da floresta que se esticava como um dedo e tocava o estacionamento pelos fundos. Eu podia dizer a ela que havia esquecido um livro no meu carro…
Será que alguém notaria que eu fui a última pessoa com a qual ela foi vista?
Estava chovendo, como sempre; dois casacos de chuva escuros se movendo na direção errada não chamariam tanta atenção, nem me denunciariam.
A não ser pelo fato de eu não ser o único estudante que estava consciente dela hoje – apesar de nenhum estar tão devastadoramente consciente dela quanto eu. Mike Newton, em particular, estava consciente de cada movimento que ela fazia se mexendo na cadeira – ela estava desconfortável ao meu lado, assim como qualquer um estaria, assim como eu já esperava antes que o cheiro dela destruísse todos os traços de preocupação por caridade. Mike Newton repararia se ela deixasse a sala comigo.
Se eu pudesse agüentar uma hora, será que eu poderia agüentar duas? Eu vacilei com a dor da queimação.
Era iria para uma casa vazia. O chefe de polícia Swan trabalhava o dia inteiro. Eu conhecia a casa dele, assim como eu conhecia todas as casinhas da cidade. A casa dele ficava acima da encosta da floresta, sem vizinhos próximos. Mesmo se ela tivesse tempo pra gritar, e ela não teria, não haveria ninguém por perto pra ouvir.
Essa era a forma mais responsável de lidar com isso. Eu havia agüentado sete décadas sem sangue humano. Se eu segurasse a respiração, eu poderia agüentar duas horas. E quando eu a encontrasse sozinha, não haveria chances de alguém mais se machucar. E não há motivo pra apressar a experiência, o monstro em minha cabeça concordou.
Eu estava me enganando ao pensar que, salvando os dezenove humanos dessa sala com esforço e paciência, eu seria menos monstro quando matasse essa garota inocente.
Apesar de odiá-la, eu sabia que o meu ódio era injusto. Eu sabia que quem eu realmente odiava era eu mesmo. Eu odiaria a nós dois muito mais quando ela estivesse morta.
Eu consegui passar a hora desse jeito – imaginando as melhores formas de matá-la.
Eu tentei evitar pensar no ato de verdade. Isso seria demais pra mim; eu acabaria perdendo essa batalha e matando todo mundo que eu visse. Então eu planejei a estratégia e nada mais.
Isso me ajudou a passar a hora.
Uma vez, quase no final, ela olhou pra mim pela fluida parede dos seus cabelos. Eu podia sentir o ódio injustificado queimando em mim quando eu olhei nos olhos dela – eu vi a minha reflexão em seus olhos assustados. O sangue pintou suas bochechas antes que ela pudesse se esconder em seus cabelos de novo, e eu quase me desfiz.
Mas o sinal tocou. Salva pelo gongo – que clichê. Nós dois estávamos salvos. Ela, salva de sua morte. Eu, salvo por um curto período de tempo de ser a criatura de pesadelos que eu temia e não suportava.
Eu não consegui caminhar tão devagar quanto devia quando saí da sala. Se alguém estivesse olhando pra mim, poderia ter suspeitado que havia alguma coisa anormal no jeito como eu me movia. Ninguém estava prestando atenção em mim. Todos os pensamentos humanos ainda rondavam a garota que estava condenada a morrer em pouco mais de uma hora.
Eu me escondi no meu carro.
Eu não gostava de pensar em mim mesmo tendo que me esconder. Isso soava muito covarde. Mas esse era inquestionavelmente o caso agora.
Eu não estava suficientemente disciplinado pra ficar perto de humanos agora. Me concentrar tanto em não matar um deles havia acabado com todos os meus recursos para resistir a matar os outros. Que desperdício isso seria. Se eu tinha que dar o braço a torcer para o monstro, eu podia pelo menos fazer o desafio valer a pena.
Eu coloquei o CD de música que geralmente me acalmava, mas ele fez pouco por mim agora. Não, o que mais ajudou agora foi o ar frio, molhado, limpo que entrava com a chuva pelas minhas janelas abertas. Apesar de eu conseguir me lembrar do cheiro do sangue de Bella Swan com perfeita clareza, inalar o ar limpo era como lavar o interior do meu corpo contra as infecções.
Eu estava são de novo. Eu podia pensar de novo. E eu podia lutar de novo. E eu podia lutar contra o que eu não queria ser.
Eu não tinha que ir até a casa dela. Eu não queria matá-la.
Obviamente, eu era uma criatura racional, uma criatura que pensava, e eu tinha uma escolha. Sempre havia uma escolha.
Não era isso o que parecia na sala de aula… mas agora eu estava longe dela. Talvez, se eu a evitasse muito, muito cuidadosamente, não houvesse motivos para a minha vida mudar. Eu tinha as coisas sob controle do jeito como elas eram agora. Por que eu deveria deixar alguém agravante e delicioso arruinar isso? Eu não tinha que desapontar o meu pai. Eu não tinha que causar estresse à minha mãe, preocupação… dor. Sim, isso machucaria a minha mãe adotiva também. E Esme era tão gentil, tão delicada e suave. Causar dor a alguém como Esme era verdadeiramente indesculpável.
Era irônico que eu tivesse tido vontade de proteger essa garota da ameaça desprezível, sem dentes, dos pensamentos de Jessica Stanley. Eu era a última pessoa que iria querer servir de protetor de Isabella Swan. Ela jamais precisaria de proteção de alguma coisa tanto quanto ela precisava de mim.
Onde estava Alice?, eu me perguntei de repente. Ela não havia me visto matar a garota Swan de alguma forma? Por que ela não apareceu para ajudar – para me parar ou para me ajudar a limpar as provas, o que quer que fosse? Será que ela estava tão preocupada em livrar Jasper de problemas que ela havia deixado passar essa possibilidade muito mais horrorosa? Será que eu era mais forte do que eu pensava? Será que eu realmente não teria feito nada com a garota?
Não. Eu sabia que isso não era verdade. Alice deve estar se concentrando bastante em Jasper.
Eu procurei na direção em que eu sabia que ela estaria, no pequeno prédio que era usado para as aulas de inglês. Não me levou muito tempo localizar sua “voz” familiar. E eu estava certo. Todos os seus pensamentos estavam voltados pra Jasper, vendo todas as suas pequenas escolhas a cada minuto.
Eu desejei poder pedir seus conselhos, mas, ao mesmo tempo, eu estava feliz que ela não soubesse do que eu era capaz. Que ela não soubesse do massacre que eu havia planejado na hora anterior.
Eu senti uma nova queimação pelo meu corpo – a da vergonha. Eu não queria que nenhum deles soubesse.
Se eu pudesse evitar Bella Swan, se eu pudesse conseguir não matá-la – mesmo enquanto eu pensava nisso, o monstro trincava e rangia os dentes, cheio de frustração – então ninguém teria que saber. Se eu pudesse manter distância do cheiro dela…
Não havia razão para que eu não tentasse, pelo menos. Fazer uma boa escolha. Tentar ser o que Carlisle pensava que eu era.
A última hora de escola já estava quase acabada. Eu decidi começar a colocar o meu novo plano em ação imediatamente. Era melhor do que ficar sentado no estacionamento, onde ela poderia passar a qualquer minuto e arruinar minha tentativa. De novo, eu senti o ódio injusto por essa garota. Eu odiava que ela tivesse esse poder inconsciente sobre mim. Que ela conseguisse me fazer ser algo que eu repugnava.
Eu caminhei rapidamente – um pouco rapidamente demais, mas não havia testemunhas – através do pequeno campus até a secretaria. Não havia razão pra Bella Swan cruzar o meu caminho. Ela seria evitada como a praga que ela era.
A secretaria estava vazia, com exceção da secretária, a única que eu queria ver.
Ela não reparou na minha entrada silenciosa.
- Sra. Cope?
A mulher com o cabelo desnaturalmente vermelho olhou pra cima e os olhos dela se arregalaram. Eu sempre os pegava fora de guarda, pequenos marcadores que eles não conseguiam entender, não importava quantos de nós eles já tivessem visto.
- Oh. – Ela ofegou, um pouco corada. Ela alisou sua blusa. Boba, ela pensou consigo mesma. Ele quase é novo o suficiente pra ser meu filho. Novo demais pra eu pensar nele desse jeito… – Olá, Edward. O que eu posso fazer por você? – Seus cílios flutuaram por trás das lentes dos seus grossos óculos.
Desconfortável. Mas eu sabia ser charmoso quando eu queria ser. Era fácil, já que eu era capaz de saber instantaneamente como qualquer tom ou gesto meu era recebido.
Eu me inclinei para a frente, encontrando seu olhar como se estivesse olhando profundamente dentro dos seus olhos marrons rasos, pequenos. Os pensamentos dela já estavam em polvorosa. Isso iria ser simples.
- Eu estava me perguntando se você pode me ajudar com os meus horários – eu disse com a minha voz suave que era reservada a não assustar humanos.
Eu ouvi o ritmo do coração dela acelerar.
- É claro, Edward. Como eu posso ajudar? – Jovem demais, jovem demais, ela repetiu para si mesma. Errada, é claro. Eu era mais velho que o avô dela. Mas, de acordo com a minha carteira de motorista, ela estava certa.
- Eu estava imaginando se eu poderia trocar a minha aula de Biologia para o nível mais alto de Ciências. Física, talvez?
- Algum problema com o Sr. Banner, Edward?
- Absolutamente não, é só que eu já estudei esse material…
- Naquela escola acelerada que você estudou no Alaska, certo? – Os lábios finos dela se torceram enquanto ela considerava isso. Eles todos já deveriam estar na faculdade. Eu já ouvi todos os professores reclamando. Notas perfeitas, nunca hesitavam antes de responder, nunca respondiam errado num teste – como se eles encontrassem uma forma de colar em todos os assuntos. O Sr. Varner preferiria admitir que tem alguém colando do que dizer que existe alguém mais inteligente que ele… Eu aposto que a mãe deles os instrui… – Na verdade, Edward, a aula de física já está muito cheia agora. O Sr. Banner odeia ter mais de vinte e cinco alunos na sala de aula -
- Eu não daria nenhum problema.
É claro que não. Não um Cullen perfeito.
- Eu sei disso, Edward. Mas simplesmente não tem lugares suficientes…
- Então eu posso desistir da aula? Eu posso usar o período pra estudos independentes.
- Desistir de Biologia? – A boca dela se abriu. Isso é loucura. Quão difícil pode ser ver um assunto que você já viu? DEVE haver algum problema com o Sr. Banner. Eu me pergunto se devo falar sobre isso com Bob. – Você não teria créditos suficientes pra se formar.
- Eu posso acompanhar no ano que vem.
- Talvez você devesse falar com os seus pais sobre isso.
A porta se abriu atrás de mim, mas quem quer que fosse não estava pensando em mim, então eu ignorei a chegada e me concentrei na Sra. Cope. Eu me inclinei um pouco mais pra perto e abri meus olhos um pouco mais. Isso funcionaria melhor se eles estivessem dourados em vez de pretos. A negritude assustava as pessoas, tal como devia.
- Por favor, Sra. Cope? – Eu fiz minha voz ficar o mais suave e convincente que eu pude – e isso podia ser consideravelmente convincente. – Não há uma outra seção à qual eu possa me mudar? Será que não existe nenhuma vaga em aberto em algum lugar? Biologia no sexto horário pode ser a única opção…
Eu sorri pra ela, tomando cuidado pra não mostrar os meus dentes demais pra não assustá-la, deixando a expressão se suavizar no meu rosto.
O coração dela bateu mais rápido. Jovem demais, ela dizia para si mesma freneticamente. – Bem, talvez eu pudesse falar com Bob – quero dizer, o Sr. Banner. Eu posso ver se -
Um segundo foi o que levou para tudo mudar: a atmosfera na sala, a minha missão aqui, a razão pela qual eu me inclinava para a mulher de cabelos vermelhos… O que havia sido por um propósito, agora era por outro.
Um segundo foi só o que demorou pra Samantha Wells abrir a porta e jogar uma assinatura que ela havia pego na cesto ao lado da porta e correr para fora de novo, com pressa de sair da escola. Um segundo foi tudo o que levou para uma rajada repentina de vento passar pela porta e vir me atingir. Um segundo foi o tempo que eu levei pra me dar conta de por que aquela primeira pessoa não havia me atrapalhado com os seus pensamentos.
Eu me virei, apesar de não precisar ter certeza. Eu me virei lentamente, lutando pra controlar os meus músculos que se rebelavam contra mim.
Bella Swan ficou com as costas pressionadas na parede ao lado da porta, com um papel agarrado nas mãos.
Os olhos dela estava ainda maiores do que o normal quando ela percebeu o meu olhar feroz, desumano.
O cheiro dela saturou cada pequena partícula de ar na sala pequena, quente. Minha garganta ficou em chamas.
O monstro olhou pra mim pelo espelho dos olhos dela de novo, uma máscara do mal.
Minha mão hesitou no ar em cima do balcão. Eu não teria que olhar para bater com a cabeça da Sra Cope na mesa dela com força suficiente pra matá-la. Duas vidas, ao invés de vinte. Uma troca.
O monstro esperou ansiosamente, faminto, que eu fizesse isso.
Mas sempre havia uma escolha – tinha que haver.
Eu parei o movimento dos meus pulmões e fixei o rosto de Carlisle na frente dos meus olhos. Eu me virei de volta pra olhar para a Sra. Cope e ouvi a surpresa interna dela com a mudança da minha expressão. Ela se afastou de mim, mas o medo dela não saiu em palavras coerentes.
Usando todo o auto-controle que eu havia aprendido em minhas décadas de auto-negação, eu fiz a minha voz ficar uniforme e suave. Havia ar o suficiente nos meus pulmões pra falar uma ultima vez, apressando as palavras.
- Deixa pra lá então. Eu vejo que é impossível. Muito obrigado por sua ajuda.
Eu me virei e me lancei pela porta, tentando não sentir o calor do sangue quente do corpo da garota enquanto eu passei a apenas alguns centímetros dela.
Eu não parei até estar no meu carro, me movendo rápido demais em todo o caminho até lá.
A maioria dos humanos já havia ido embora, então não havia muitas testemunhas.
Eu ouvi um garoto do segundo ano, D.J. Garrett, notar e depois deixar pra lá…
De onde foi que Cullen saiu? Foi como se ele tivesse aparecido com o vento… Lá vou eu com minha imaginação de novo. Minha mãe sempre diz…
Quando eu escorreguei para dentro do meu Volvo, os outros já estavam lá. Eu tentei controlar a minha respiração, mas eu estava asfixiando por ar fresco como se estivesse sufocando.
- Edward? – Alice perguntou com uma voz alarmada.
Eu só balancei a minha cabeça pra ela.
- O que diabos aconteceu com você? – Emmett quis saber, distraído, por um momento, do fato de Jasper não estar no clima de aceitar a sua revanche.
Ao invés de responder, eu dei a ré no carro. Eu tinha que sair daquele estacionamento antes que Bella me seguisse aqui também. Meu demônio pessoal me perseguindo… Eu virei o carro e acelerei. Eu já estava nos quarenta antes de chegar à estrada. Na estrada, eu fiz setenta antes de chegar à esquina.
Sem olhar, eu sabia que Emmett, Rosalie e Jasper se viraram todos para olhar para Alice.
Ela levantou os ombros. Ela não podia ver o que havia se passado, só o que estava por vir.
Ela olhou pra mim agora. Nós dois estávamos processando o que ela viu em sua cabeça agora, e nós dois estávamos surpresos.
- Você vai embora? – ela sussurrou.
Os outros olharam pra mim agora.
- Eu vou? – eu assoviei através dos meus dentes.
Ela viu nessa hora, enquanto a minha decisão ia para outro caminho e outra escolha virara o meu futuro pra uma direção mais escura.
- Oh.
Bella Swan morta. Meus olhos brilhando, vermelhos com o sangue fresco. A procura que se seguiria. O tempo cuidadoso que nos levaria a esperar até que fosse seguro sair e começar tudo de novo…
- Oh – ela disse de novo. A imagem ficou mais específica. Eu vi o interior da casa do Chefe Swan pela primeira vez, vi Bella na pequena cozinha com os armários amarelos, com as costas viradas pra mim enquanto eu a perseguia na escuridão… deixava o cheiro dela me guiar até ela…
- Pare! – eu rugi, incapaz de agüentar mais.
- Desculpa – ela cochichou com os olhos arregalados.
O monstro gostou.
E a visão na cabeça dela mudou de novo. Uma avenida vazia à noite, as árvores ao lado dela cobertas de neve, brilhando com os quase duzentos quilômetros por hora.
- Eu vou sentir sua falta – ela disse. – Não importa quão curto seja o tempo que você vai ficar fora.
Emmett e Rosalie trocaram um olhar apreensivo.
Nós já estávamos quase na curva da longa estrada que levava à nossa casa.
- Nos deixe aqui – Alice sugeriu. – Você deve dizer isso a Carlisle pessoalmente.
Eu balancei a cabeça e o carro guinchou quando parou de repente.
Emmett, Rosalie e Jasper saíram silenciosamente; eles fariam Alice explicar tudo quando eu fosse embora. Alice tocou o meu ombro.
- Você vai fazer a coisa certa – ela murmurou. Não era uma visão dessa vez, era uma ordem. – Ela é a única família de Charlie Swan. Isso o mataria também.
- Sim – eu disse, concordando apenas com a última parte.
Ela saiu pra se juntar aos outros, as sobrancelhas dela estavam se juntando por causa da ansiedade.
Eles se enfiaram nas matas, desaparecendo de vista antes que eu pudesse virar o carro.
Eu acelerei de volta à cidade, e eu sabia que as visões na cabeça de Alice estariam passando de negras a claras num piscar de olhos.
Enquanto eu corria pra Forks com mais de noventa quilômetros por hora, eu não tinha certeza do que estava fazendo. Dizer adeus ao meu pai?
Ou abraçar o monstro que havia dentro de mim?
A estrada passava voando por baixo dos meus pneus.

2. Livro Aberto

 

Eu inclinei as costas contra o banco fofo com neve, deixando o pó seco se refazer em volta de meu peso. Minha pele esfriou para se igualar ao ar envolta de mim, e os pequenos pedaços de gelo pareciam como veludo embaixo da minha pele.

O céu acima de mim estava limpo, brilhante com estrelas, ficando azul em algumas partes, e amarelo em outras. As estrelas apareceram majestosamente, em formas redondas contra o universo negro -uma maravilhosa vista. Requintadamente bonita. Ou melhor, deveria ter sido requintadamente. Teria sido, se eu pudesse vê-las.

Eu não estava ficando nada melhor, já haviam se passado seis dias, seis dias que eu estava escondido no vazio deserto Denali, mas eu não estava nem perto da liberdade desde o primeiro momento em que fui preso pelo seu perfume.

Quando eu olhei para o o céu estrelado, era como se tivesse uma obstrução entre meus olhos e a beleza dele. A obstrução era um rosto, um rosto humano pouco notável, mas eu não parecia poder baní-lo da minha mente.

Eu ouvi os pensamentos aproximando-se antes de ouvir os passos que os acompanhavam. O som do movimento era apenas um desfalecido suspiro contra o pó.

Eu não estava surpreso que Tanya havia me seguido até aqui. Eu sabia que ela estava refletindo sobre esta conversa pelos últimos dias, adiando até que ela estivesse exatamente certa do que ela queria dizer.

Ela apareceu há uns 54 metros, pulando até a ponta de uma rocha escura à vista, balançando-se nas solas dos pés   A pele de Tanya estava cinza na luz das estrelas, os seus cabelos louros brilhavam palidamente, quase rosa com mechas avermelhadas. Seus olhos amarelados brilharam rapidamente quando ela olhou para mim, meio enterrada na neve, e seus lábios se esticaram lentamente formando um sorriso.

Delicadamente. Se eu pudesse vê-la. Eu suspirei.

Ela agachou até a ponta da rocha, as pontas de seus dedos tocando a rocha, o corpo dela girou.

Bola de neve, ela pensou.

Ela se lançou no ar, sua forma tornou-se escura, uma sombra giratória na medida que ela girava entre mim e as estrelas. Ela se curvou até uma bola, assim que ela tocou a a pilha do banco de neve junto à mim.

Um nevoal caiu em cima de mim. A estrelas ficaram pretas, e eu estava enterrado, coberto de cristais de gelo.

Eu suspirei de novo, mas não me movi para me desenterrar. A escuridão abaixo da neve não podia piorar e nem melhorar a visão. Eu ainda via o mesmo rosto.

“Edward?”

E depois a neve voava de novo, assim que Tanya me desenterrou rapidamente. Ela limpou o pó do meu rosto imóvel, não totalmente olhando em meus olhos.

“Desculpa.” Ela murmurou. “Foi uma piada.”

“Eu sei. Foi engraçado.”

Sua boca deformou para baixo.

“Irina e Kate falam que eu deveria te deixar em paz. Elas acham que eu te incomodo.”

“Não mesmo,” Eu assegurei à ela “Pelo contrário, sou eu quem está sendo rude -abominavelmente rude. Eu sinto muito.”

Você está indo para casa, não está? Ela pensou.

“Eu ainda.. não me decidi… totalmente.”

Mas você não vai ficar aqui. Seu pensamento era melancólico agora, triste.

“Não. Isso não parece estar… ajudando.”

Ela fez uma careta. “É minha culpa, não é?”

“Claro que não,” eu menti rapidamente.

Não seja cavalheiro.

Eu sorri.

Eu faço você se sentir desconfortável, ela acusou.

“Não.”

Ela levantou uma sobrancelha, sua expressão estava tão descrente que eu tive que rir. Um curto riso, seguido por outro suspiro.

“Está bem,” eu admiti. “Um pouco.”

Ela suspirou também e colocou o seu queixo sob suas mãos. Seus pensamentos estavam mortificados.

“Você é mil vezes mais amável do que as estrelas, Tanya. É claro que você é bem consciente disso. Não deixe a minha teimosia minar a sua confiança.” eu ri com a impossibilidade disso.

“Eu não estou acostumada com a rejeição,” ela grunhiu, seu lábio inferior se pôs para fora em um atraente beicinho.

“Certamente não,” eu concordei, tentando sem muito sucesso bloquear os seus pensamentos enquanto ela se aprofundava por dentre suas milhares de conquistas. Em sua maioria, Tanya preferia os homens humanos – eles eram muito mais populares para uma única coisa, com a vantagem de serem suaves e quentes. E sempre sedentos, definitivamente.

“Succubus,” eu soltei, na esperança de interromper as imagens que surgiam em sua mente.

Ela sorriu, mostrando seus dentes. “A original.”

Diferente de Carlisle, Tanya e suas irmãs descobriram suas consciências lentamente. No final, foi o afeto pelos homens humanos que colocaram as irmãs contra o massacre. Agora os homens que elas amaram… viveram.

“Quando você apareceu aqui,” Tanya disse lentamente. “Eu pensei que…”

Eu sabia o que ela tinha pensado. E eu devia saber que ela ia se sentir assim. Mas eu não estava no meu melhor momento racional naquela hora..

“Você pensou que eu havia mudado de idéia.”

“Sim,” Ela me olhou com cara feia.

“Eu me sinto horrível por brincar com as suas expectativas, Tanya. Eu não queria – Eu não estava pensando. É que eu saí… com um pouco de pressa.”

“Eu imagino que você não vai me contar o porque…?”

Eu me sentei e enrolei meus braços ao redor das minhas pernas, me curvando defensivamente. “Eu não quero falar sobre isso.”

Tanya, Irina e Kate se adaptaram muito bem à vida que elas se comprometeram. Melhor, em algumas maneiras, até do que Carlisle. Apesar da proximidade insana que elas se permitiram a aqueles que deviam ser – e uma vez foram – suas presas, eles não cometeram erros. Eu estava muito envergonhado em admitir minha fraqueza para Tanya.

“Problemas com mulheres?” Ela perguntou ignorando minha relutância.

Eu dei um sorriso obscuro “Não do jeito que você quer dizer”

Então ela ficou quieta. Eu escutei seus pensamentos enquanto ela os mudava, tentando decifrar o significado de minhas palavras.

“Você não está nem perto” – Eu a avisei.

“Uma dica?” ela me perguntou.

“Por favor, esqueça isso, Tanya.”

Ela estava quieta de novo, especulando. Eu a ignorei tentando, em vão, admirar as estrelas.

Ela desistiu depois de um momento de silêncio e seus pensamentos tomaram outra direção.

Se você nos deixar, pra onde você vai, Edward? De volta pro Carlisle?

“Eu não acho que seja possível” Eu suspirei.

Pra onde eu iria? Eu não podia imaginar um lugar em todo o planeta que fosse me interessar. Porque não importa para onde eu fosse, eu estaria indo para lugar algum – eu estaria apenas fugindo.

Eu odiava isso. Quando eu me tornei tão covarde?

Tanya colocou seus braços sobre os meus ombros. Eu enrijeci mas eu não tirei seu braço dali. Ela queria dizer que não havia nada como o apoio de um amigo.

Praticamente.

“Eu acho que você vai voltar.” – ela disse com sua voz pegando um pouco do seu sotaque russo – “Não importa o que seja ou quem seja que está machucando você. Você vai enfrentar isso. Você é esse tipo.”

Seus pensamentos estavam de acordo com as suas palavras. Eu tentei abraçar a visão de mim que ela carregava em sua cabeça. Aquele que enfrenta as coisas de cabeça levantada. Eu nunca duvidei de minha coragem, minha habilidade de enfrentar situações adversas. Até aquela aula terrível de biologia há pouco tempo atrás.

Eu beijei sua bochecha, voltando rapidamente quando ela torceu seu rosto em direção ao meu. Seus lábios já enrugados. Ela sorriu da minha rapidez.

“Obrigada, Tanya. Eu precisava ouvir isso.”

Seus pensamentos tornaram-se petulantes “De nada, eu acho. Eu gostaria que você fosse mais racional sobre as coisas, Edward.”

“Me desculpe, Tanya. Você sabe que é boa demais para mim. Eu apenas… não achei o que eu estou procurando ainda.”

“Bom, se você for embora antes de eu te ver de novo. Tchau,Edward.”

“Tchau, Tanya” – Enquanto eu falava as palavras, eu pude ver isso. Eu podia me ver saindo de lá, de volta para o lugar onde eu gostaria de estar. – “Obrigada – de novo.”

Ela estava em pé num movimento. E depois ela tinha saído, desaparecendo entre a neve. Ela não olhou para trás. Minha rejeição a deixou mais incomodada do que ela já tinha ficado antes, até em seus pensamentos. Ela não queria me ver antes de partir.

Meus lábios se contorceram com desapontamento. Eu não gostava de machucar a Tanya, apesar de seus sentimentos não serem tão profundos e dificilmente puros. De todos os modos não era algo que eu poderia corresponder. E eu continuava me sentido menos gentil.

Eu coloquei meu queixo no meu joelho e olhei para as estrelas novamente mesmo estando de repente ansioso para voltar ao meu caminho. Eu sabia que Alice me veria voltando para casa e contaria aos outros. Isso os faria feliz – principalmente Carlisle e Esme. Mas eu admirei as estrelas mais uma vez e tentando ver passado na minha cabeça. Entre eu e o as luzes brilhantes no céu um par de olhos castanhos confusos voltando para mim, me fazendo perguntar o que essa decisão significaria para ela.

É claro, eu não poderia ter certeza que era isso que seus olhos curiosos procuravam. Nem na minha imaginação eu conseguia ouvir seus pensamentos. Os olhos de Bella Swan continuavam questionando e uma não obstruída visão das estrelas continuou a me invadir. Com um leve suspiro, eu desisti. Se eu corresse, eu estaria de volta ao carro do Carlisle em menos de uma hora.

Numa pressa para ver minha família – e para voltar a ser aquele Edward que enfrenta as coisas – eu destruí o iluminado de neves não deixando marcas de pés.

“Tudo ficará bem” – Alice encorajou. Seus olhos estavam sem foco e o Jasper tinha uma mão sob seu cotovelo, a guiando enquanto entrávamos na cafeteria num grupo fechado. Rosalie e Emmett tamparam o caminho, Emmett ridículo como um guarda costas no meio do território inimigo. Rose parecia preocupada também porém bem mais irritada do que protetora.

“Claro que ficará.” – eu grunhi. O comportamento deles era burlesco. Se eu não tivesse certeza de que agüentaria esse momento, eu teria ficado em casa.

A repentina mudança para o nosso normal mesmo na lúdica manhã – havia nevado ontem à noite e Emmett e Jasper tirando vantagem da minha distração para me bombardear com bolas de neve; quando eles se cansaram da minha falta de resposta eles se viraram um para o outro – esse excesso de vigilância teria sido cômica se não fosse tão irritante.

“Ela não está aqui ainda, mas ela virá. Ela não desconfiará se nós sentarmos no lugar de sempre.”

“Claro que nós vamos sentar no lugar de sempre! Pare com isso Alice. Você está me dando nos nervos. Eu ficarei absolutamente bem.”

Ela piscou seus olhos uma vez enquanto o Jasper a ajudava a se sentar e seus olhos finalmente se focaram em minha face.

“Hmm…” ela disse, parecia surpresa. “Acho que você está certo”

“Claro que eu estou!” eu murmurei.

Eu odiava estar no foco da preocupação deles. Eu senti uma certa solidariedade por Jasper lembrando-me das inúmeras vezes que nós o superprotegemos. Ele percebeu de relance meus sentimentos e sorriu.

Irritante, não é?

Eu consenti para ele.

Foi apenas semana passada que esse grande e pardo aposento parecia mortalmente depressivo para mim?

Pareceria quase como um sonho, um coma estar aqui?

Hoje meus nervos estavam firmes – conexões de pianos, intensamente tocados a leves pressões. Meus sentidos estavam hiper alertas, eu vistoriei cada som, cada suspiro, cada movimento do ar que tocaram minha pele, cada pensamento. Especialmente os pensamentos. Só havia um sentindo que eu me recusei a usar. Olfato, é claro.

Eu não respirei.

Eu estava esperando escutar mais sobre os Cullen nos pensamentos do que realmente aconteceu. Todo o dia eu estive esperando, procurando por cada novo pensamento sobre Bella Swan ter confessado, tentando ver que direção a nova fofoca que seguiria. Mas não tinha nada. Ninguém notou que havia 5 vampiros no refeitório, exatamente como antes da nova garota entrar. Muitos humanos aqui ainda estavam pensando sobre aquela garota, os mesmos pensamentos da semana passada. Em vez de estar inalteravelmente entediado, eu estava fascinado.

Ela não tinha falado nada para ninguém sobre mim?

Não tinha nenhuma chance de que ela não tivesse percebido meu obscuro, assassino brilho. Eu a vi reagir a isso. Óbvio, eu assustei aquela tola. Eu estava convencido de que ela havia mencionado isso para alguém, talvez até tivesse exagerado na história um pouco para fazê-la melhor. Atribuindo-me alguns traços ameaçadores.

E então, ela também me ouvindo tentando cancelar nossas aulas compartilhadas de biologia. Ela deve ter imaginado, depois de ver a minha expressão, se ela tinha sido a causa. Uma garota normal teria perguntado por aí, comparado a sua experiência com os outros, procurado por algum terreno em comum que pudesse explicar o meu comportamento e então ela não se sentiria sozinha. Humanos estão constantemente desesperados por se sentirem normal, por se encaixarem. Para se misturar com os outros ao seu redor, como mais uma ovelha sem graça no rebanho. Essa necessidade era particularmente forte durante os inseguros anos da adolescência. Essa garota não devia ser uma exceção à regra.

Mas ninguém tinha dado atenção a nós sentados aqui, em nossa mesa normal. Bella devia estar excepcionalmente tímida, se ela tinha confidenciado com alguém. Talvez ela tenha falado com o seu pai, talvez esse fosse seu melhor relacionamento… Apesar de isso soar improvável, dado o fato de que ela havia passado tão pouco tempo com ele durante sua vida. Ela devia ser mais próxima de sua mãe. Mesmo assim, eu devia passar pelo Chefe Swan alguma hora e ouvir o que ele estava pensando.

“Algo novo?” Jasper perguntou.

“Nada. Ela… não deve ter dito nada.”

Todos ergueram uma sobrancelha com as novidades.

“Talvez você não seja tão assustador quanto você acha que é.” Emmett disse, rindo. “Eu aposto que eu a teria apavorado mais do que ISSO.”

Eu rolei meus olhos até ele.

“Imaginando o porquê…?” ele se surpreendeu com a minha revelação sobre o silêncio único da garota.

“Nós já passamos por isso. Eu não SEI.”

“Ela está vindo,” Alice murmurou então. Eu senti meu corpo ficar rígido. “Tente parece humano.”

“Humano, você diz?” Emmet perguntou.

Ele levantou seu punho direito, girando os dedos para revelar a bola de neve que tinha guardado em sua palma. É claro que ela não havia derretido ali. Ele a apertou em um grumoso bloco de gelo. Ele tinha os olhos em Jasper, mas eu vi a direção de seus pensamento. Alice também, claro. Quando ele abruptamente lançou o pedaço de gelo nela, ela o jogou longe com um leve balançar de seus dedos. O gelo ricocheteou através do corredor da cafeteria; muito rápido para os olhos humanos, e se fragmentou com um agudo barulho na parede de tijolo. O tijolo quebrou também.

As cabeças na esquina da cafeteria todas se viraram para olhar para a pilha de gelo no chão, e se viraram para procurar sua origem. Não olharam para muitas mesas ao longe. Ninguém olhou para nós.

“Muito humano, Emmett,” Rosalie disse de maneira fulminante. “Por que você não soca a parede enquanto estiver perto?”

“Seria mais impressionante se você fizesse isso, baby.”

Eu tentei prestar atenção neles, mantendo um sorriso fixo no meu rosto como se eu estivesse fazendo parte da brincadeira. Eu não me permiti olhar em direção aonde ela estava em pé. Mas isso foi tudo que eu escutei também.

Eu pude ouvir a impaciência de Jessica com a garota nova, que parecia estar distraída, também, permanecendo imóvel na fila em movimento. Eu vi, nos pensamentos de Jessica, que as bochechas de Bella Swan ficaram mais uma vez rosas com o sangue.

Eu respirei curta e rapidamente, pronto para parar de respirar se qualquer traço de seu odor tocasse o ar ao meu redor.

Mike Newton estava com as duas garotas. Eu ouvia as duas vozes, mental e verbal, quando ele perguntou o que havia de errado com a garota Swan. Eu não gostava do modo com os seus pensamentos estavam envolvidos nela, um brilho de suas fantasias já construídas encobriram sua mente enquanto ele a observava ficar surpresa e olhar para cima como se ela tivesse esquecido que ele estivesse ali.

“Nada,” eu ouvi Bella dizer em uma voz baixa e clara. Parecia soar com um sino sobre todos os murmúrios da cafeteria, mas eu sabia que isso era somente porque eu estava escutando de forma tão intensa.

“Eu vou tomar só um refrigerante hoje,” ela continuou enquanto ela se movia para seguir com a fila.

Eu não consegui evitar olhar de relance em sua direção. Ela estava olhando para o chão, o sangue lentamente se esvaindo de seu rosto. Eu olhei para longe rapidamente, para Emmet, que riu agora de um sorriso aflito em meu rosto.

Você parece doente, mano.

Eu re-arranjei minhas feições para parecer mais casual e natural.

Jessica estava imaginando sobre a falta de apetite da garota. “Você não está com fome?”

“Na verdade, eu me sinto um pouco doente.” Sua voz soou mais baixa, mas ainda assim, perfeitamente clara.

Por que isso me incomodava, uma preocupação protetora que repentinamente surgiu dos pensamentos do Newton? O que importava que houvesse um timbre possessivo neles? Não era exatamente da minha conta se Mike Newton se sentia desnecessariamente ansioso por ela. Talvez esse fosse o modo que todos correspondiam à ela. Eu não queria, instintivamente, protegê-la, também?

Antes que eu quisesse matá-la, isto é…

Mas aquela garota estava doente?

Era difícil de julgar – ela parecia tão delicada com aquela pele translúcida… então eu percebi que eu estava me preocupando, também, assim como aquele garoto estúpido, e eu forcei a mim mesmo não pensar sobre a saúde dela.

Sem levar em consideração que eu não gostava de monitorá-la pelos pensamentos de Mike. Troquei para Jessica, olhando cuidadosamente enquanto eles três escolhiam uma mesa para sentar. Felizmente, eles sentaram-se com as companhias usuais de Jessica, uma das primeiras mesas do lugar. Não na direção do vento, assim como Alice havia prometido.

Alice me acotovelou. Ela vai olhar para cá, aja como humano.

Eu trinquei meus dentes por detrás de meu sorriso.

“Se acalme, Edward,” Emmet disse. “Honestamente. Então você matou um humano. Isso é dificilmente o fim do mundo”.

“Você deve saber.” eu murmurei.

Emmet riu. “Você tem que aprender a fazer outras coisas. Como eu faço. Eternidade é muito tempo para ficar rolando na culpa.”

E então, Alice lançou uma pequena mão cheia de gelo que ela havia ocultado na confiante cara de Emmet.

Ele piscou, surpreso, e então sorriu em antecipação.

“Você pediu por isso,” ele disse, enquanto ele se inclinava sobre a mesa e sacudia seu cabelo coberto de gelo em sua direção. A neve, derretendo no cômodo quente, lançou-se de seu cabelo em um denso banho metade líquido, metade gelo.

“Eca!” Rose reclamou, enquanto ela e Alice recuavam da inundação.

Alice riu e todos nós a acompanhamos. Eu podia ver na mente de Alice como ela havia orquestrado esse momento perfeito e eu sabia que aquela garota – eu tinha que parar de pensar nela dessa maneira, como se ela fosse a única garota do mundo – Bella devia estar nos olhando rindo e brincando, parecendo felizes e humanos e de forma tão irreal como uma pintura de Norman Rockwell.

Alice continuou rindo, e segurando a sua bandeja como um escudo. Aquela garota – Bella devia estar nos encarando.

… encarando os Cullens de novo, alguém pensou, prendendo a minha atenção.

Eu olhei automaticamente em direção ao chamado não intencional, percebendo enquanto meus olhos encontravam a sua origem, que eu havia reconhecido a voz – eu a havia ouvido muito hoje.

Mas meus olhos passaram direto por Jessica e se focaram na observação penetrante da garota.

O que ela estava pensando? A frustração parecia aumentar enquanto o tempo passava, ao invés de diminuir. Eu tentei – de forma incerta no que eu estava fazendo já que eu nunca havia tentado isso antes – sondar com a minha mente o silêncio ao redor dela. Minha audição extra vinha naturalmente para mim, sem pedir; eu nunca tive que forçá-la. Mas agora eu estava concentrado, tentando passar por qualquer escudo ao redor dela.

Nada além de silêncio.

O que ela tem? Jessica pensou, ecoando minha própria frustração.

“Edward Cullen está te encarando,” ela sussurrou no ouvido da garota Swan, com um sorriso falso. Não houve nenhuma insinuação de sua irritação invejosa no seu tom. Jessica pareceu ser experiente no fingimento de amizade.

Eu escutei, muito claramente, à resposta da garota.

“Ele não parece irritado, parece?” ela sussurrou de volta.

Então ela havia notado a minha reação selvagem semana passada. É claro que ela havia.

A pergunta pareceu confundir Jessica. Eu vi a minha própria face em seus pensamentos enquanto ela checava a minha expressão, mas eu não encontrei com seu olhar. Eu ainda estava concentrado na garota, tentando ouvir alguma coisa. O meu foco intencional não parecia estar ajudando em nada.

“Não,” Jess disse a ela, e eu sabia que ela desejava poder dizer que sim – como isso a envenenou por dentro, meu olhar – apesar de ela não demonstrar de forma alguma em sua voz: “Ele devia estar?”

“Eu não acho que ele goste de mim,” a garota sussurrou de volta, deitando a sua cabeça em seu braço como se ela estivesse subitamente cansada. Eu tentei entender seu movimento, mas eu só pude fazer suposições. Talvez ela estivesse cansada.

“Os Cullens não gostam de ninguém,” Jess assegurou a ela: “Bem, eles nem se quer percebem alguém o suficiente para gostar deles.” Eles nunca notaram. O seu pensamento foi um rosnado de reclamação. “Mas ele ainda está te encarando.”

“Pare de olhar para ele,” a garota disse ansiosamente, erguendo a sua cabeça para ter certeza que a Jessica a obedeceu.

Jessica sorriu, mas fez o que ela pediu.

A garota não tirou os olhos de sua mesa pelo resto do tempo. Eu pensei – imaginei, é claro, eu não podia ter certeza – que isso foi intencional. Parecia que ela queria olhar para mim. O seu corpo se deslocaria ligeiramente na minha direção, o seu queixo começava a virar, e então ela se repreendia, respirava fundo e olhava fixamente para qualquer pessoa que estava falando.

Eu ignorei a maior parte dos outros pensamentos ao redor da garota, como eles não eram, momentaneamente, sobre ela. Mike Newton estava planejando uma guerra de neve no estacionamento depois da escola, sem parecer perceber que a neve já tinha mudado para chuva. A agitação dos leves flocos contra o teto já tinha se tornado o padrão comum de gotas de água. Ele realmente não conseguia ouvir a mudança? Parecia alta para mim.

Quando a hora do almoço terminou, eu continuei no meu lugar. Os humanos iam saindo, e eu me peguei tentando distinguir o som dos passos dela do som do resto, como se houvesse algo importante ou incomum neles. Que estupidez.

Minha família também não se mexeu para ir embora. Eles esperaram para ver o que eu iria fazer.

Eu iria para a classe, sentar ao lado da garota onde eu podia sentir a fragrância absurdamente potente de seu sangue e sentir o calor de sua pulsação do ar na minha pele? Eu era forte o suficiente para isso? Ou já tinha tido o suficiente para um dia?

- Eu… acho que está tudo bem. – Alice disse, hesitante. – Sua mente está segura. Eu acho que você conseguira agüentar por uma hora.

Mas Alice sabia muito bem a rapidez que uma mente podia mudar.

- Por que arriscar, Edward? – Jasper perguntou. Embora ele não quisesse se sentir presunçoso que eu fosse o fraco agora, eu podia escutar que ele se sentia, só um pouco. – Vá para casa. Vá com calma.

- Qual é o problema? – Emmett discordou. – Ou ele vai ou não vai matá-la. Melhor acabar com isso de uma vez, de um jeito ou do outro.

- Eu não quero me mudar ainda. – Rosalie reclamou. – Eu não quero recomeçar. Estamos quase fora do colegial, Emmett. Finalmente.

Eu estava igualmente despedaçado com esta decisão. Eu queria, queria muito, encarar isso de cabeça do que fugir para longe outra vez. Mas eu também não queria me arriscar muito, também. Havia sido um erro semana passada para Jasper ficar tanto tempo sem caçar; isso era um erro sem propósito também?

Não queria desarraigar minha família. Nenhum deles me agradeceria por isso.

Mas eu queria ir para a minha aula de biologia. Percebi que queria ver o rosto dela novamente.

Foi isso o que decidiu por mim. Essa curiosidade. Estava irritado comigo mesmo por sentir isso. Não tinha prometido que não iria deixar o silêncio da mente da garota me deixar desnecessariamente interessado nela? E mesmo assim, aqui estava eu, ainda mais desnecessariamente interessado.

Eu queria saber o que ela estava pensando. A mente dela era fechada mas seus olhos eram muito abertos. Talvez eu pudesse ver por eles.

- Não, Rose, eu acho que vai ficar tudo bem. – Alice disse. – Está… se firmando. Eu tenho noventa e três por cento de certeza de que nada de ruim vai acontecer se ele for para a classe. – Ela me olhou curiosamente, se perguntando o que havia mudado em meus pensamentos que fez sua visão do futuro mais segura.

Curiosidade seria o suficiente para manter Bella Swan viva?

Emmett tinha razão – por que não acabar com isso, de um jeito ou de outro? Eu iria enfrentar a tentação de cabeça.

- Vão para suas classes. – Eu ordenei, me afastando da mesa. Eu me virei e andei para longe deles sem olhar para trás. Eu podia ouvir a preocupação de Alice, a censura de Jasper, a aprovação de Emmett e a irritação de Rosalie se arrastando às minhas costas.

Eu respirei fundo mais uma vez na porta da sala de aula, e segurei o ar em meus pulmões enquanto entrava no espaço pequeno e quente.

Não estava atrasado.  O Sr. Banner ainda estava se arrumando para a experiência de laboratório de hoje. A garota sentou na minha – na nossa mesa, seu rosto para baixo de novo, encarando o caderno em que desenhava. Eu examinei os rabiscos quando me aproximei, interessado até mesmo nessa criação banal da sua mente, mas eram coisas sem sentido. Só fazendo ondas e mais ondas. Talvez ela não estivesse se concentrando no padrão, mas pensando em outra coisa?

Eu puxei minha cadeira com um barulho desnecessário, deixando raspar no chão de linóleo; humanos sempre se sentiam mais confortáveis quando algum barulho anunciava a aproximação de alguma outra pessoa.

Eu sabia que ela tinha escutado o som; ela não olhou para cima, mas a sua mão errou uma onda no formato que ela estava fazendo, deixando-o desbalanceado.

Por que ela não olhou para cima? Provavelmente ela estava assustada. Eu tinha que ter certeza de deixá-la com uma impressão diferente desta vez. Fazê-la pensar que havia imaginado coisas antes.

- Olá. – eu disse na voz calma que usava quando queria deixar humanos mais confortáveis, formando um sorriso educado com meus lábios que não mostraria nenhum dente.

Ela olhou para cima então, seus atentos olhos castanhos assustados – quase desconcertados – e cheios de perguntas silenciosas. Era a mesma expressão que tinha obstruído minha visão pela ultima semana.

Enquanto eu encarava aqueles olhos castanhos estranhamente intensos, eu percebi que o ódio – o ódio que eu tinha imaginado que esta menina merecia por simplesmente existir – havia evaporado. Sem respirar agora, sem sentir seu cheiro, era difícil de acreditar que alguém tão vulnerável pudesse justificar ódio.

As bochechas dela começaram a corar e ela não disse nada.

Eu mantive meus olhos nos dela, me concentrando só em suas profundezas questionadoras, e tentando ignorar a cor apetitosa. Eu tinha fôlego suficiente para falar mais um pouco sem inalar.

- Meu nome é Edward Cullen. – eu disse, embora soubesse que ela sabia disso. Era o jeito educado de começar. – Não tive a oportunidade de me apresentar na semana passada. Você deve ser Bella Swan.

Ela pareceu confusa – havia uma pequena ruga entre seus olhos novamente. Ela levou meio segundo a mais do que deveria para responder.

- Como você sabe meu nome? – ela perguntou, e sua voz tremeu um pouco.

Eu devia tê-la realmente assustado. Isso me fez sentir culpado; ela era tão indefesa. Eu ri gentilmente – era um som que eu sabia que deixava humanos mais à vontade. Novamente, fui cuidadoso com meus dentes.

- Ah, eu acho que todo mundo sabe seu nome. – Certamente ela devia ter percebido que ela tinha se tornado o centro das atenções nesse lugar monótono. – A cidade toda estava esperando você chegar.

Ela fez uma careta como se essa informação fosse desagradável. Eu achei que, sendo tímida como ela parecia ser, atenção iria parecer uma coisa ruim para ela. A maioria dos humanos sentia o oposto. Embora eles não quisessem se destacar em uma multidão, ao mesmo tempo eles desejavam um holofote por suas uniformidades individuais.

- Não. – ela disse. – Quer dizer, por que me chamou de Bella?

- Prefere Isabella? – eu perguntei, perplexo pelo fato de que não podia ver para onde a sua pergunta estava levando. Eu não entendi. Com certeza, ela deixou sua preferência clara muitas vezes naquele primeiro dia. Todos os humanos eram incompreensíveis assim sem um contexto mental como guia?

- Não, gosto de Bella. – ela respondeu, inclinando a cabeça levemente para um lado. Sua expressão – se eu estivesse lendo corretamente – estava dividida entre vergonha e confusão. – Mas eu acho que Charlie… quer dizer, meu pai, deve me chamar de Isabella nas minhas costas. É como todo mundo aqui parece me conhecer.- Sua pele ficou um tom de rosa mais escuro.

- Ah. – eu disse indevidamente, e rapidamente desviei meus olhos de seu rosto.

Eu tinha acabado de entender o que as perguntas dela queria dizer: eu tinha escorregado – cometido um erro. Se eu não tivesse escutando as conversar dos outros naquele primeiro dia, então eu teria chamado inicialmente pelo nome inteiro, como todos os outros. Ela tinha notado a diferença.

Eu senti uma dor de desconforto, foi muito rápido para ela perceber meu erro. Bem astuta, especialmente para alguém que deveria estar aterrorizada pela minha proximidade.

Mais se tinha problemas maiores do que qualquer suspeita sobre mim ela estava trancando dentro de sua cabeça.

Eu estava sem ar. Se eu fosse falar com ela de novo, eu teria que respirar.

Seria difícil evitar falar. Infelizmente para ela, compartilhar esta mesa a tornava minha parceira de laboratório, e nós teríamos que trabalhar juntos hoje. Seria estranho – e incompreensivelmente rude – eu ignorá-la enquanto nós fazíamos a experiência. Iria deixá-la mais suspeita, com mais medo…

Eu me inclinei para o mais longe que eu podia dela sem mexer minha cadeira, virando minha cabeça para o corredor. Firmei-me, travando meus músculos no lugar, e então suguei um pulmão inteiro de ar rapidamente, respirando por minha boca.

Ahh!

Era genuinamente doloroso. Mesmo sem sentir o cheiro dela, ou podia sentir o gosto dela em minha língua. Minha garganta de repente estava em chamas outra vez, a necessidade tão forte como a daquele primeiro momento em que eu senti o cheiro dela.

Juntei meus dentes e tentei me recompor.

- Podem começar. – O Sr. Banner comandou.

Pareceu que tomou cada pequena partícula do auto-controle que eu tinha acumulado em setenta anos de trabalho árduo para virar minha cabeça para a garota, que estava olhando para a mesa, e sorrir.

- Primeiro as damas, parceira? – eu ofereci.

Ela olhou para minha expressão e seu rosto ficou vazio, os olhos arregalados. Havia algo de errado com a minha expressão? Ela estava assustada novamente? Ela não falou.

- Ou eu posso começar, se preferir. – eu disse calmamente.

- Não. – ela disse, e seu rosto passou de branco para vermelho outra vez. – Eu começo.

Eu encarei o equipamento na mesa, o microscópio arranhado, a caixa de slides, ao invés de ver o sangue correr por baixo da pele clara. Respirei de novo depressa, por meus dentes, e recuei quando o gosto fez minha garganta arder.

- Prófase. – ela disse depois de um rápido exame. Ela começou a remover o slide, embora ela mal o tinha visto.

- Importa-se se eu olhar? – Instintivamente – estupidamente, como se eu fosse da espécie dela – eu estendi para parar a mão que removia o slide. Por um segundo, o calor de sua pele queimou a minha. Foi como uma corrente elétrica – certamente muito mais quente do que meros 37 graus. O tiro de calor passou pela minha mão e correu pelo meu braço. Ela puxou rapidamente a sua mão debaixo da minha.

“Desculpe-me,” eu murmurei por dentre meus dentes trincados. Precisando de algum lugar para olhar, eu segurei o microscópio e olhei brevemente pelo buraco. Ela estava certa.

“Prófase,” eu concordei.

Eu ainda estava demasiadamente perturbado para olhá-la. Respirando tão calmamente quanto eu podia por dentre meus dentes cerrados e tentando ignorar a sede furiosa, eu tentava me concentrar naquela simples tarefa, escrevendo a palavra no espaço adequado na lâmina do laboratório, e então trocando o primeiro slide pelo próximo.

O que ela estava pensando agora? Como será que ela se sentiu, quando eu toquei a sua mão? Minha pele deve ter parecido gelo – repulsivo. Não me admirava que estivesse tão quieta.

Eu dei uma olhada no slide.

“Anáfase.” eu disse para mim mesmo enquanto eu escrevia na segunda linha.

“Posso?” ela perguntou.

Eu olhei para cima, para ela, surpreso ao ver que ela estava esperando, na expectativa, uma mão metade estendida em direção ao microscópio. Ela não parecia estar com medo. Ela realmente pensava que eu tinha errado na resposta?

Eu não me segurei e sorri com o seu olhar esperançoso no rosto enquanto eu passava o microscópio para ela.

Ela encarou no microscópio com uma vontade que logo desapareceu. Os cantos de sua boca rapidamente desceram.

“Slide 3?” Ela perguntou, sem olhar pra cima do microscópio, mas com sua mão estendida. Eu coloquei o próximo slide na mão dela, sem deixar minha pele chegar perto da dela dessa vez. Sentar do lado dela era como sentar do lado de uma lâmpada. Eu podia sentir conforme eu esquentava aos poucos com a temperatura mais alta.

Ela não olhou para o slide por muito tempo. “Interfase” ela disse de forma casual – talvez tentando com muita vontade – e empurrou o microscópio na minha direção. Ela não encostou no papel, mas esperou que eu escrevesse a resposta. Eu chequei – ela estava certa de novo.

Nós terminamos dessa forma, falando uma palavra por vez nunca nos olhando nos olhos. Nós éramos os únicos que haviam acabado – os outros na aula estavam tendo mais dificuldade com o laboratório. Mike Newton parecia estar tendo problemas se concentrando – ele estava tentando observar Bella e eu.

“Queria que ele tivesse ficado onde ele foi” Mike pensou, me olhando com raiva. Hmm, interessante. Eu não tinha notado que o garoto tinha mantido algum sentimento negativo sobre mim. Isso era um novo acontecimento, tão recente quanto à chegada da nova garota. Ainda mais interessante, eu pensei – para minha própria surpresa – que o sentimento era mútuo.

Eu olhei pra baixo para a garota de novo, perplexo pelo tamanho da devastação e violência que, apesar de comum; sem ameaças aparente, ela estava causando em minha vida.

Não era como se eu não pudesse ver o que Mike estava pensando. Ela na verdade estava bonita…de uma forma diferente. Melhor do que estando bonita, seu rosto estava interessante. Não tão simétrico – seu queixo mais pontudo fora de sincronia com as maçãs do rosto largas; fortemente ruborizadas. – o claro e escuro contraste da sua pele e seu cabelo; e então os olhos. Brilhando sobre silenciosos segredos.

Olhos que de repente estavam perdidos nos meus.

Eu a encarei de volta, tentando descobrir pelo menos um de seus segredos.

“Você está usando lentes?” ela perguntou de repente.

Que pergunta estranha. “Não” Eu quase sorri com a idéia de tentar melhorar minha visão.

“Ah” ela murmurou. “Eu achei que tinha algo diferente nos seus olhos.”

Eu me senti gelado de novo conforme eu notei que aparentemente eu não era o único tentando descobrir segredos hoje.

É claro que tinha algo diferente nos meus olhos desde a última vez que ela tinha olhado neles. Para me preparar para hoje, a tentação de hoje, eu passei o fim de semana inteiro caçando, matando minha sede o máximo possível, mais do que o necessário.  Eu me afoguei no sangue de animais, não que fizesse muita diferença na frente do absurdo sabor flutuando ao redor do ar perto dela. Quando eu olhei para ela por fim, meus olhos tinham estado pretos pela sede. Agora, meu corpo nadando em sangue, meu olhos estavam com uma cor dourada. Castanho-claro, âmbar pelo meu excesso de alimento.

Outro lapso. Se eu tivesse notado o que ela quis dizer com a pergunta, poderia somente ter dito que eram lentes.

Eu sentei ao lado de humanos por quase dois anos nessa escola, ela foi a primeira a tentar me examinar perto o suficiente para notar a diferença de cor nos meus olhos. Os outros, enquanto admiravam a beleza da minha família, tinham a tendência de olhar para baixo rapidamente quando nós olhávamos de volta. Eles sempre se protegiam, bloqueando detalhes das nossas aparências como uma tentativa forte e instintiva de nos entender. Ignorância era uma dádiva para a mente humana.

Por que tinha que ser essa garota que via tanto?

Sr. Banner se aproximou da nossa mesa. Eu agradecido inalei o ar puro que ele trouxe consigo antes que pudesse misturar com o cheiro dela.

“Então, Edward,” ele disse olhando nossas respostas, “você não acha que Isabella deveria ter uma chance com o microscópio?”

“Bella” Eu corrigi ele por puro reflexo. “Na verdade ela identificou três de cinco.”

Os pensamentos de Mr.Banner eram céticos enquanto ele se virava para ela. “Você já fez essa aula antes?”

Eu assisti, envolvido, quando ela sorriu, parecendo um pouco envergonhada.

“Não com raiz de cebola.”

“Ovas de peixe?” ele perguntou.

“Sim.”

Isso o surpreendeu. A aula de hoje foi algo que ele pegou de um curso mais avançado. Ele assentiu de maneira pensante. “Você estava em um programa avançado em Phoenix?”

“Sim.”

Ela era avançada, então, inteligente para uma humana. Isso não me surpreendeu.

“Bem,” o Sr.Banner disse, franzindo o lábio. “Eu suponho que é bom que vocês dois sejam parceiros então.” Ele virou e foi embora murmurando “Para que os outros possam ter uma chance te aprender algo por eles mesmos.”. Eu duvido que a garota possa ouvir isso. Ela voltou a desenhar círculos ao redor da sua pasta.

Dois lapsos em meia hora. Uma demonstração insatisfatória da minha parte. Apesar de que eu não tinha nenhuma idéia do que a garota pensava de mim – quando ela tinha medo, quando ela suspeitava?

Suspeitava? – eu sabia que precisaria me esforçar mais daqui para frente para fazê-la mudar sua opinião sobre mim. Alguma coisa para fazê-la esquecer-se do nosso ameaçador último encontro.

“É ruim essa neve toda, não é?” Eu disse repetindo o assunto que vários outros alunos já haviam discutido. Um tópico habitual e entediante. O tempo – sempre seguro.

Ela olhou para mim, a dúvida óbvia em seu olhar – uma reação anormal para minhas palavras muito normais.

Eu tentei direcionar a conversa de volta a um caminho mais comum. Ela era de um lugar muito mais claro, mais quente – sua pele parecia refletir isso de alguma maneira, apesar de sua palidez – e o frio devia fazê-la se sentir desconfortável. Meu toque gelado com certeza tinha…

“Você não gosta do frio,” eu adivinhei.

“E do molhado,” ela assentiu.

“Forks deve ser um lugar difícil para você viver.” Talvez você não devesse ter vindo para cá, eu quis acrescentar. Talvez você devesse voltar ao lugar de onde veio.

Porém, eu não tinha certeza se era isso que eu queria. Eu sempre me lembraria do cheiro de seu sangue – existia ao menos alguma garantia de que eu não a seguiria? Além disso, se ela fosse embora, sua mente sempre seria um mistério. Um constante e insistente quebra-cabeças.

“Você não faz idéia,” ela disse em voz baixa e me senti carrancudo por um momento.

Suas respostas nunca eram o que eu esperava que fossem. Isso me fez querer fazer mais perguntas.

“Por que você veio para cá, então?” eu reclamei, percebendo que meu tom de voz era muito acusatório, não era casual o bastante para a conversa. A pergunta pareceu rude, intrometida.

“É… complicado.”

Ela piscou seus grandes olhos, não dando maiores informações, e eu quase explodi de curiosidade – a curiosidade queimou tão forte quanto à sede em minha garganta. Na realidade, estava ficando um pouco mais fácil respirar; a agonia estava ficando mais tolerável enquanto eu me familirializava.

“Eu acho que posso agüentar,” eu insisti. Talvez a cortesia comum a fizesse continuar respondendo minhas perguntas tanto quanto eu era rude o suficiente para perguntá-las.

Ela encarou silenciosamente suas mãos. Isso me deixou impaciente; eu queria colocar minha mão embaixo de seu queixo e levantar sua cabeça para que eu pudesse ler seus olhos. Mas fazer isso seria tolice de minha parte – perigoso – tocar sua pele novamente.

Ela levantou os olhos subitamente. Era um alívio poder ver as emoções em seus olhos novamente. Ela falou apressadamente, correndo pelas palavras.

“Minha mãe casou-se novamente.”

Ah, isso era humano suficiente, fácil de entender. A tristeza passou por seus olhos claros e ela enrugou de novo a testa.

“Não parece tão complicado,” eu disse. Minha voz soou gentil sem que eu me esforçasse para isso. Sua tristeza me fez sentir estranhamente impotente, desejando que houvesse algo ao meu alcance para fazê-la sentir-se melhor.

Um estranho impulso. “Quando isso aconteceu?”

“Setembro passado.” Ela expirou pesadamente – nada mais que um suspiro. Eu segurei minha respiração e sua respiração quente varreu meu rosto.

“E você não gosta dele,” eu supus, pescando maiores informações.

“Não, o Phil é legal,” ela disse, corrigindo suposição. Havia a ponta de um sorriso agora nos cantos de seus lábios cheios. “Muito jovem, talvez, mas legal o suficiente.”

Isso não se encaixava com a cena que eu havia construído em minha cabeça.

“Por que você não fica com eles?” eu perguntei, minha voz um pouco curiosa demais. Parecia que eu estava sendo bisbilhoteiro. E eu estava sendo, eu admito.

“Phil viaja muito. Ele joga bola.” O pequeno sorriso cresceu; essa escolha de carreira a divertia.

Eu sorri, também, sem escolher fazê-lo. Eu não estava tentando fazê-la sentir-se à vontade. Seu sorriso apenas me fez querer sorrir de volta – fazer parte do segredo.

“Eu já ouvi falar dele?” eu passei o rosto dos jogadores de baseball em minha cabeça, me perguntando qual deles era Phil…

“Provavelmente não. Ele não joga bem.” Outro sorriso. “Só na menor liga. Ele se muda muito.”

Os rostos em minha mente desapareceram instantaneamente e eu fiz uma lista de possibilidades em menos de um segundo. Ao mesmo tempo, eu estava imaginando uma nova cena.

“E sua mãe te mandou pra cá pra poder viajar com ele,” eu disse. Fazer suposições parecia funcionar mais com ela do que fazer perguntas. Funcionou de novo. Seu queixo ficou proeminente e sua expressão de repente ficou dura.

“Não, ela não me mandou pra cá,” ela disse, e sua voz tinha novo tom, duro e irritado. Minha suposição a havia deixado triste, embora eu não pudesse entender o por que. “Eu mandei a mim mesma.”

Eu não consegui entender seu motivo, ou a razão por detrás de sua tristeza. Eu estava completamente perdido.

Então eu desisti. Essa garota simplesmente não fazia sentido algum. Ela não era como os outros humanos. Talvez o silêncio em seus pensamentos e o perfume em seu cheiro não fossem as únicas coisas incomuns nela.

“Eu não entendo,” eu admiti, odiando ceder.

Ela suspirou, e olhou nos meus olhos por mais tempo do que a maioria dos humanos normais seriam capazes de suportar.

“No início ela ficou comigo, mas ela sentia a falta dele,” ela explicou devagar, seu tom ficando mais desesperado a cada palavra.  “Eu a fiz infeliz, então eu decidi que estava na hora de passar um tempo de qualidade com Charlie.”

A mínima ruga entre seus olhos se intensificou.

“Mas agora você está triste,” eu murmurei. Eu não conseguia parar de falar minhas hipóteses em voz alta, desejando aprender com suas reações. Esta, porem, não parecia tão diferente do normal.

“E?” ela disse, como se esse não fosse um aspecto que merecesse ser considerado.

Eu continuei olhando em seus olhos, sentindo que finalmente eu havia conseguido uma olhadela dentro de sua alma. Eu vi naquela única palavra onde ela havia posicionado ela mesma em sua lista de prioridades. Diferente dos outros humanos, suas próprias necessidades estavam bem abaixo na lista.

Ela era altruísta.

Quando notei isso, o mistério naquela pessoa se escondendo nessa mente silenciosa começou a desaparecer.

“Isso não parece justo,” eu disse. Eu encolhi meus ombros, tentando parecer casual, tentando omitir a intensidade de minha curiosidade.

Ela riu, mas não havia diversão no som. “Ninguém nunca disse a você? A vida não é justa.”

Eu queria rir com suas palavras embora eu, também, não tivesse me divertido. Eu sabia um pouco sobre a injustiça da vida. “Eu acredito que tenha ouvido isso em algum lugar antes.”

Ela olhou de volta para mim, parecendo confusa de novo. Ela desviou os olhos e depois olhou de novo nos meus.

“Então, isso é tudo,” ela me disse.

Mas eu não estava preparado para finalizar esta conversa. O pequeno “V” entre seus olhos, um resto de seu pesar, me perturbava. Eu queria arrancá-la com a ponta do meu dedo, mas obviamente eu não podia tocá-la. Isso não era seguro de varias formas.

“Você faz um belo show,” eu disse devagar, ainda considerando a próxima hipótese. “Mas eu seria capaz de apostar que você está sofrendo mais do que deixa os outros verem.”

Ela fez uma cara, seus olhos apertados e sua boca se torcendo em um beicinho, e ela olhou de volta para a frente da sala. Ela não gostou quando eu supus corretamente. Ela não era o mártir mediano – ela não queria uma platéia para sua dor.

“Eu estou errado?”

Ela recuou um pouco, mas por outro lado fingindo não me ouvir.

Isso me fez sorrir. “Eu pensei que não.”

“Por que isso te interessa?” ela quis saber, ainda olhando para longe.

“Esta é uma pergunta muito boa,” eu admiti, mais para mim mesmo do que para responder a ela.

Seu discernimento era melhor que o meu – ela estava bem no centro das coisas enquanto eu me debatia cegamente através das pistas. Os detalhes de sua vida muito humana não deviam interessar a mim. Era errado para mim me interessar pelo que ela pensava. Para proteger minha família das suspeitas, pensamentos humanos não eram significantes.

Eu não costumava ser o menos intuitivo em um par. Eu confiei no meu extra “ouvir demais” – eu obviamente não era tão perceptivo quanto eu achei que fosse.

A garota suspirou e ficou carrancuda encarando a frente da sala. Algo em sua expressão frustrada era engraçado. A situação em si, toda a conversa era engraçada. Ninguém nunca esteve tão em perigo por mim quanto esta pequena garota – a qualquer momento eu poderia, distraído pela minha ridícula absorção em nossa conversa me descontrolar e atacá-la antes que eu pudesse me segurar – e ela estava irritada porque eu não havia respondido sua pergunta.

“Eu estou perturbando você?” eu perguntei, rindo do absurdo daquilo tudo.

Ela me deu uma olhadela rapidamente, e depois seus olhos pareceram cair em minha armadilha.

“Não exatamente” ela me disse. “Eu estou mais perturbada comigo mesma. Minha cara é tão fácil de ser lida – minha mãe sempre diz que sou o livro aberto dela.”

Ela franziu as sobrancelhas de mau humor.

Eu olhei para ela me divertindo. A razão de ela estar de mau humor era porque ela pensava que eu vi através dela muito facilmente. Que bizarro. Eu nunca havia me esforçado tanto para compreender alguém em toda a minha vida – ou existência, quando vida não era a palavra adequada. Eu não tinha realmente uma vida.

“Pelo contrário,” eu discordei, me sentindo estranhamente… cauteloso, como se houvesse algum perigo escondido que eu estava falhando em ver. Eu estava subitamente na corda bamba, a premonição me fazendo ansioso. “Eu acho você muito difícil de ler.”

“Você deve ser um leitor muito bom, então,” ela supôs, fazendo sua própria suposição, que estava novamente correta.

“Normalmente,” eu concordei.

Eu sorri largamente para ela, deixando meus lábios retorcerem para expor os cintilantes e afiados dentes atrás deles.

Foi algo estúpido de fazer, mas fiz repentinamente, inesperadamente desesperado para expressar algum tipo de aviso para a menina. Seu corpo estava perto de mim como antes, inconscientemente deslocado no decorrer da nossa conversa. Todos os pequenos marcadores e cantos eram suficientemente assustadores para o resto da humanidade que não viam como trabalhar nela. Por que ela não se encolheu longe de mim com terror? Com certeza ela deve ter visto bastante do meu lado sombrio para perceber o perigo, ela parecia ser intuitiva.

Eu não vi se minha advertência teve o efeito desejado, Mr. Banner disse para a classe ter atenção apenas por aquele momento, e ela recuou para longe de mim ao mesmo tempo. Ela parecia um pouco aliviada por causa da interrupção, então talvez ela tenha compreendido inconscientemente.

Eu esperava que sim.

Eu reconheci o fascinio cada vez maior dentro de mim, mesmo estando cansado para cortá-lo para fora. Eu não podia me dar ao luxo de achar Bella Swan interessante. Ou melhor, ela não poderia se dar ao luxo. Eu já estava ansioso por alguma outra chance de falar com ela… Eu queria saber mais sobre sua mãe, sua vida antes de chegar aqui, seu relacionamento com seu pai. Todos as coisas  sem sentido que poderia acrescentar detalhes ao seu caráter. Mas a cada segundo que eu gastei com ela foi um erro, um risco que ela não sabe que estava correndo.

Distraidamente, ela jogou seu cabelo. Por um momento eu me permiti outra respiração. Uma onda particularmente concentrada de seu cheiro bateu em minha garganta.

Era como o primeiro dia – como a destruição inicial. A dor que queimava e a sede me fez ficar tonto. Eu poderia agarrar a mesa de novo para manter meu corpo na cadeira. Agora eu tinha um pouco mais de controle. Eu não quebraria nada, no mínimo… O monstro rosnou dentro de mim, mas nada comparado com o prazer da minha dor. Ele estava também firmemente amarrado por aquele momento.

Eu parei de respirar completamente, e me inclinei o mais longe possivel da garota o quanto eu pude.

Não, eu não podia me dar ao luxo de achá-la fascinante… A mais interessante coisa que encontrei nela, provavelmente a maior, era aquela que eu poderia matá-la. Eu já tinha cometido dois pequenos erros hoje. Eu poderia cometer um terceiro, que não seria nada pequeno?

Um pouco antes do sinal tocar, eu abandonaria a sala de aula – provavelmente destruindo qualquer impressão de educação que eu havia construído no decorrer da hora. De novo, eu ofeguei por limpeza, o ar de fora estava úmido, como se fosse um perfume de cura. Eu me coloquei apressadamente ao máximo de distancia possível entre a garota e eu.

Emmet estava me esperando na porta da sala de Espanhol. Ele leu minha expressão louca por um momento.

Como foi? Ele perguntou cautelosamente.

“Ninguém morreu,” Eu resmunguei.

Eu achei isso. Quando eu vi a Alice andando por aqui quando acabou, eu pensei…

Nós andamos para a sala, eu vi sua memória por apenas alguns momentos antes, vendo pela porta aberta de sua última aula: Alice de rosto desligado andando em direção ao prédio de biologia. Eu senti que na sua lembrança ele sentia vontade de ir lá e se juntar a ela, e quando ele decidiu ficar. Se Alice precisasse de sua ajuda, ela poderia pedir…

Eu fechei meus olhos com horror e desgosto quando eu despenquei na minha cadeira. “Eu não pensei em realizar aquilo quando estava perto. Eu não pensei o que eu estaria fazendo… Eu não vi que aquilo poderia ser tão ruim,” Eu sussurei.

Não foi, ele me re-assegurou. Ninguém morreu, certo?

“Certo,” Eu disse entre os dentes. “Não dessa vez.”

Talvez fique mais fácil.

“Claro.”

Ou, talvez você a mate. Ele deu de ombros. Você não seria o primeiro a fazer besteira. Ninguém te julgaria duramente. Às vezes uma pessoa apenas cheira muito bem. Estou impressionado que você tenha resistido tanto tempo.

“Não está ajudando, Emmett.”

Eu estava revoltado com a sua aceitação da idéia de que eu mataria a garota, de que isso era de algum modo, inevitável. Era culpa dela que ela cheirasse tão bem?

Eu sei quando aconteceu pra mim… Ele lembrou, trazendo à tona metade de um século, para uma rua suja, onde uma mulher de meia idade estava tirando seus lençóis secos de um varal amarrado entre duas macieiras. O cheiro de maçãs era forte no ar – a colheita tinha acabado e as frutas rejeitadas estavam espalhadas pelo chão, os machucados nas suas cascas deixavam escapar as suas fragrâncias como grossas nuvens. Um campo recém cortado de feno era um fundo de paisagem para o cheiro, a harmonia. Ele andou pela rua, tudo menos distraído para a mulher, para entregar um pagamento por Rosalie. O céu lá encima estava púrpura, laranja acima das árvores. Ele teria continuado vagando pelo caminho das carroças e lá não teria nenhuma razão para lembrar daquela tarde, se não fosse por uma repentina brisa que soprou os lençóis brancos como velas e levou o cheiro da mulher até o rosto de Emmett.

“Ah,” Eu suspirei calmamente. Como se a minha própria sede não fosse o suficiente.

Eu sei. Eu não durei nem metade de um segundo. Eu nem pensei em resistir.

Sua memória se tornou muito explícita pra eu agüentar.

Eu fiquei em pé, meus dentes se trincaram forte o suficiente para cortar aço.

“Esta bien, Edward?” Señora Goff perguntou, assustada pelo meu brusco movimento. Eu podia ver o meu rosto na sua mente, e eu sabia que eu parecia longe de estar bem.

“Me perdona,” eu murmurei, enquanto eu me lançava para a porta.

“Emmett – por favor, puedas tu ayuda a tu hermano?” ela perguntou, gesticulando sem solução para mim enquanto eu me apressava pra sair da sala.

“Claro,” eu escutei ele falar. E logo ele já estava bem atrás de mim.

Ele me seguiu até o lado mais longe do prédio, onde ele me alcançou e pôs a sua mão no meu ombro.

Eu empurrei a mão dele pra longe com uma força desnecessária. Teria quebrado os ossos de uma mão humana, e os ossos do braço ligados a ela.

“Me desculpe, Edward.”

“Eu sei.” Eu extraí profundas arfadas de ar, tentando clarear a minha cabeça e os meus pulmões.

“É tão ruim quanto aquilo?” ele perguntou, tentando não pensar no cheiro e no sabor de sua memória enquanto ele perguntou, não tendo muito sucesso.

“Pior, Emmett, pior.”

Ele ficou quieto por um instante.

Talvez…

“Não, não seria melhor se eu acabasse logo com isso. Volte para a sala, Emmett. Eu quero ficar sozinho.”

Ele se virou sem falar nenhuma palavra ou pensamento e caminhou rapidamente. Ele diria para a professora de Espanhol que eu estava doente, ou matando aula, ou um vampiro perigosamente fora de controle. A desculpa dele realmente importava? Talvez eu não voltasse. Talvez eu tenha que partir.

Eu voltei pro meu carro novamente, para esperar o final da aula. Para me esconder, novamente.

Eu poderia ter usado o tempo para fazer decisões ou tentar reforçar minha explicação, mas, como um vício, eu me vi buscando através dos murmúrios de pensamentos que emanavam do prédio da escola. As vozes familiares se destacaram, mas eu não estava interessado em dar ouvidos as visões de Alice ou as reclamações de Rosalie agora. Eu achei Jessica facilmente, mas a garota não estava com ela, então continuei procurando. Os pensamentos de Mike Newton tomaram a minha atenção, e eu acabei achando-a, em um ginásio com ele. Ele estava triste, porque eu conversei com ela na aula de Biologia. Ele estava pensando sobre sua responsabilidade quando algo surgiu do nada…

Eu nunca o vi conversando com ninguém nada mais que uma palavra aqui ou ali. Claro que ele acabou achando Bella interessante. Eu não gosto do jeito que ele olha pra ela. Mas ela não parece estar muito interessada nele. O que ela disse? “Imagino o que ele tinha na segunda passada…” Algo assim. Não parece que ela tenha se importado. Isso não precisava fazer parte de uma conversa…

Ele falou consigo mesmo sobre seu pessimismo daquele jeito, confortado pela idéia de que Bella não estava interessada em sua troca de palavras comigo. Isso me incomodou um pouco mais do que o aceitável, então eu parei de escutá-lo.

Eu coloquei um CD com músicas pesadas no meu som, e então aumentei o som até que não dava pra ouvir mais vozes. Eu realmente tentei me concentrar na música para me manter longe dos pensamentos de Mike Newton, para espiar a garota inocente…

Eu trapaceei algumas vezes, enquanto chegava a hora. Não espiando, eu tentava me convencer. Eu estava apenas me preparando. Eu queria saber quando exatamente iria sair do ginásio, quando ela estaria no estacionamento… Eu não queria pegá-la de surpresa.

Enquanto os estudantes começaram a sair das portas do ginásio, eu saia do meu carro, não sabendo por que eu fiz isso. A chuva estava fraca – eu ignorei isso enquanto ela ia lentamente saturando o meu cabelo.

Eu queria que ela me visse aqui? Eu esperava que ela viesse e falasse comigo? O que eu estava fazendo?

Eu não me mexi, apesar de eu estar tentando me convencer a voltar para o carro, sabendo que o meu comportamento era repreensível. Eu mantive meus braços sobre o meu peito e respirei bem devagar enquanto eu observava ela passar devagar por mim, seus lábios caídos nas extremidades. Ela não olhou para mim. Algumas vezes ela lançou os olhos em direção às nuvens com uma careta, como se eles a ofendessem.

Eu estava desapontado quando ela chegou no seu carro antes de passar por mim. Ela devia ter falado comigo? Eu devia ter falado com ela?

Ela entrou em uma caminhonete vermelha desbotada da Chevy, um monstro robusto que é mais velho que o seu pai. Eu observei ela dar a partida na caminhonete – o motor velho roncou mais alto que qualquer veículo no estacionamento – e então, ela botou suas mãos em direção ao vento quente. O frio era desconfortável para ela – não gostava nem um pouco disso. Ela passou seus dedos pelos cabelos emaranhados, esticando os nós através da corrente de ar quente, como se estivesse secando-o. Eu imaginei como a boléia daquele caminhão deveria cheirar, e então rapidamente me desfiz desse pensamento.

Ela olhou ao redor enquanto se preparava para dar ré, e finalmente olhou em minha direção. Ela olhou para mim por apenas meio segundo, e tudo o que consegui ler em seus olhos foi  surpresa, antes dela virar os seus olhos pro outro lado e passar a marcha ré. E então freou repentinamente, e a traseira da caminhonete ficou a alguns centímetros de bater no carro de Erin Teague.

Ela deu uma olhada no espelho retrovisor, sua boca aberta com o constrangimento. Quando o outro carro passou por ela, olhou todos os pontos cegos duas vezes e então saiu da área do estacionamento tão cuidadosamente que isso me fez sorrir. É como se ela pensasse que sua caminhonete decrépita fosse perigosa.

O pensamento de Bella Swan poder fazer mal a qualquer um, não importa que ela estava dirigindo, me fez rir quando passou por mim, olhando fixamente.
 

3. Fenômeno

 
Sinceramente, eu não estava sedento, mas eu decidi caçar novamente naquela noite. Uma pequena quantidade para prevenir, eu sei que seria inadequado.
Carlisle veio comigo; nós não ficávamos juntos sozinhos desde que eu retornei de Denali. Enquanto nós corríamos pela floresta negra, eu o escutei pensando sobre aquele rápido adeus da semana passada.
Em sua memória, eu vi a maneira que as minhas feições tinham se contraído em um feroz desespero. Eu senti a surpresa dele e a repentina preocupação.
“Edward?”
“Eu tenho que ir Carlisle. Tenho que ir agora.”
“O que aconteceu?”
“Nada. Ainda. Mas irá, se eu ficar.”
Ele alcançou o meu braço. Eu senti como doeu para ele quando eu recuei da sua mão.
“Eu não entendo.”
“Você já… já houve algum momento…”
Eu me vi dando uma profunda respiração, vi a selvagem luz nos meus olhos através do filtro de preocupação dele.
“Alguém já cheirou pra você melhor do que o resto das pessoas? Muito melhor?”
“Oh.”
Quando eu soube que ele tinha entendido, meu rosto caiu com vergonha. Ele me alcançou para me tocar, ignorando quando eu recuei de novo, e deixou sua mão em meu ombro.
 
“Faça o que você deve para resistir, filho. Sentirei tua falta. Aqui, pegue o meu carro. É mais rápido.”
Ele estava se perguntando agora se ele tinha feito a coisa certa antes, me mandando para longe. Se perguntando se ele teria me machucado com a sua falta de confiança.
“Não,” eu sussurrei enquanto eu corria. “Aquilo era o que eu precisava. Eu poderia tão facilmente ter traído aquela confiança, se você tivesse me falado pra ficar.”
“Desculpe se você está sofrendo, Edward. Mas você deve fazer o que pode para manter a criança Swan viva. Mesmo se isso signifique que você tem que nos deixar novamente.”
“Eu sei, eu sei.”
“Por que você voltou? Você sabe o quão feliz eu fico por te ter aqui, mas se isso é muito difícil…”
“Eu não gostei de me sentir um covarde,” eu admiti.
Nós desaceleramos – nós estávamos praticamente caminhando através da escuridão agora.
“Melhor do que botar ela em perigo. Ela partirá em um ano ou dois.”
“Você tem razão, eu sei disso.” Ao contrário, apesar, as palavras dele apenas me deixaram mais ansioso pra ficar. A garota partiria em um ano ou dois…
Carlisle parou de correr e eu parei com ele; ele se virou para examinar a minha expressão.
Mas você não vai fugir, vai?
Eu deixei a minha cabeça cair.
É por orgulho, Edward? Não há porque ter vergonha -
“Não, não é o orgulho que me mantêm aqui. Não agora.”
Você precisa ir neste momento?
Eu suspirei brevemente. “Não. Isso não é por mim, se fosse por mim, eu já teria ido.”
“Eu vou ficar com você, é claro, se você precisar. É só você dizer. É só você não se queixar ao resto. Eles não terão má vontade com isso.”
Ergui uma das sobrancelhas.
Ele suspirou. “Sim, Rosalie poderia, mas ela não deveria. Seja como for, é muito melhor para nós, irmos agora, sem ter feito nenhum dano, do que irmos mais tarde, depois de que uma vida tenha sido encerrada,” Todo humor havia chegado ao fim.
Eu fiquei com medo de suas palavras.
“Sim,” Eu concordei. Minha voz soou rouca.
Mas você está partindo?
Eu suspirei. “Eu deveria.”
“O que você está fazendo aqui, Edward? Não consigo ver…”
“Não sei como explicar,” Mesmo para mim, ainda não fazia sentido.
Ele mediu minha expressão por um longo tempo.
Não, eu não consigo ver. Mas eu vou respeitar sua privacidade, se você prefere.
“Muito obrigado. É generoso de sua parte, eu não dou privacidade a ninguém.” Com uma exceção. E eu estava fazendo o que eu podia para impedir isso, não estava?
Todos nós temos nossas peculiaridades. Ele riu novamente. Vamos?
Ele havia acabado de sentir o rastro de um pequeno rebanho de cervos. Era difícil reunir muito entusiasmo pelo que era, mesmo nas melhores circunstâncias, um aroma que fazia menos que dar água na boca. Agora, certamente, com a memória do sangue fresco da garota na minha mente, o aroma na verdade revirava o meu estômago.
Eu suspirei. “Vamos,” eu concordei, apesar de saber que forçar mais sangue por minha garganta não ajudaria muito.
Nós dois assumimos uma posição de caçada e deixamos o rastro que nos guiasse e nos puxamos em silêncio para frente.
Estava mais frio quando voltamos para casa. A neve derretida havia congelado novamente; era como se um fino lençol de vidro cobrisse tudo – cada ponta de pinheiro, cada folha das plantas, cada lâmina de grama estava congelada.
Enquanto Carlisle foi se vestir para seu primeiro turno no hospital, eu fiquei perto do rio, esperando o sol nascer. Eu me sentia quase inchado de tanto sangue que havia consumido, mas eu sabia que a falta de sede significaria pouco quando eu sentasse ao lado da garota de novo.
Frio e estático como a pedra em que me sentava, eu encarei a água fria que corria ao lado da margem congelada, encarando aquela cena.
Carlisle estava certo. Eu devia deixar Forks. Eles poderiam espalhar alguma história para explicar a minha ausência. Intercâmbio na Europa. Visitando parentes distantes. Fuga adolescente. A história não importava. Ninguém ia questionar muito.
Levaria apenas um ano ou dois para a garota desaparecer. Ela seguiria enfrente com a vida dela – ela teria que seguir enfrente com sua vida. Ela iria à faculdade de algum lugar, ficar mais velha, começar uma carreira, possivelmente até se casar com alguém. Eu podia imaginar isso – Eu podia ver a garota toda vestida de branco andando em uma profunda paz, de braços dados com seu pai.
Era sem igual a dor que aquela imagem me causou. Eu não podia entender aquilo. Eu estava com ciúmes, por que ela tinha um futuro que eu nunca teria? Aquilo não fazia sentido. Todos os humanos a minha volta tinham o mesmo potencial – uma vida – eu raramente tinha parado para envejá-los.
Eu devia deixá-la para seu futuro. Parar de arriscar a vida dela. Essa era a coisa mais certa a se fazer. Carlisle sempre escolhia o jeito certo. Eu devia escutá-lo agora.
O sol aumentou atrás das nuvens, e a luz fraca brilhou de todo o vidro congelado
Mais um dia, eu decidi. Eu podia vê-la uma vez mais. Podia lidar com aquilo. Possivelmente eu mencionaria o meu desaparecimento pendente, trazendo a história a tona.
Aquilo seria difícil; Eu podia sentir isso em cada pesada relutância que já estava me fazendo pensar em desculpas para dizer – para estender o prazo por dois dias, três, quatro… Mas eu não estaria fazendo a coisa certa. Eu sabia que podia confiar no aviso de Carlisle. E eu também sabia que podia ser muito difícil tomar a decisão certa sozinho.
Muito difícil. O quanto dessa relutância vinha da minha obsessiva curiosidade, e quanto vinha do meu insatisfeito apetite?
Eu entrei para trocar de roupa, para ir à escola.
Alice estava esperando por mim, sentada no topo da borda do terceiro andar.
Você está indo embora de novo, ela me acusou.
Suspirei e acenei com cabeça
Eu não consigo ver onde você está indo desta vez.
“Eu não sei para onde estou indo ainda,” eu sussurrei.
Eu quero que você fique.
Eu balancei minha cabeça.
Talvez eu e Jazz possamos ir com você?
“Eles vão precisar mais de você agora, se eu não estou aqui para olhar por eles. E pense em Esme. Eu levaria metade da família dela embora de uma vez?”
Você vai fazê-la tão triste.
“Eu sei. Por isso você tem que ficar.”
Não é o mesmo sem você aqui, você sabe disso.
“Sim. Mas eu tenho que fazer o que é certo.”
Existem vários jeitos certos, e muitos errados, pense, não está lá?
Por um curto momento ela foi até uma de suas estranhas visões; eu assisti junto com ela como as imagens indistintas apareciam e giraram. Eu vi a mim mesmo dentro dessas visões com estranhas sombras que eu não conseguia compreender – nebulosas, imprecisas formas.
E então, de repente, minha pele estava brilhando na luz do sol de uma pequena e aberta clareira. Eu conhecia este lugar. Havia uma figura na clareira comigo, mas novamente, era indistinta, não ali o suficiente para reconhecer. As imagens tremeram e desapareceram quando um milhão de pequenas escolhas rearranjaram o futuro novamente.
“Eu não absorvi muito disso,” eu disse quando a visão ficou escura.
Eu também. Seu futuro está mudando e mudando tanto que eu não consigo acompanhar. Mas eu acho que…
Ela parou, e vagueou por uma vasta coleção de outras visões recentes para mim. Eram todas iguais – borradas e vagas.
“Eu acho que algo está mudando, na verdade,” ela disse em voz alta. “Sua vida parece que alcançou uma encruzilhada.”
Eu ri, austero. “Você tem noção de que soa como uma cigana charlatona em um parque de diversões agora, certo?”
Ela mostrou sua pequena língua.
“Hoje está tudo bem, não é?” perguntei, minha voz abruptamente apreensiva.
“Não vejo você matando ninguém hoje,” ela me garantiu.
“Obrigado, Alice.”
“Vá se trocar. Não direi nada – deixarei que você conte aos outros quando estiver pronto.”
Ela levantou-se e seguiu escada abaixo, seus ombros um pouco curvados. Sentirei sua falta. Muito.
Sim, eu também sentiria a falta dela.
Foi uma viagem quieta até o colégio. Jasper podia dizer que Alice estava brava com alguma coisa, mas ele sabia que se ela quisesse falar sobre isso já o teria feito. Emmett e Rosalie estavam distraídos, tendo outro de seus momentos, olhando um nos olhos do outro com admiração- era um tanto nojento de se assistir pelo lado de fora. Nós todos sabíamos o quão desesperadamente apaixonados eles estavam. Ou talvez eu apenas estivesse sendo amargo por ser o único sozinho. Alguns dias eram piores que outros de se conviver com três casais perfeitos e apaixonados. Esse era um desses dias.
Talvez eles fossem mais felizes sem mim por perto, com meu temperamento ruim e hostil como o senhor de idade que eu deveria ser agora.
Claro, a primeira coisa que fiz quando chegamos ao colégio foi procurar a garota. Apenas me preparando novamente.
Certo.
Era embaraçoso como meu mundo de repente parecia ser vazio de tudo, menos ela – toda a minha existência centrada ao redor dessa garota, ao invés de em mim mesmo.
Era fácil de entender, na verdade; depois de oitenta anos da mesma coisa, todo dia, toda noite, qualquer mudança era motivo de interesse.
Ela ainda não chegara, mas eu podia ouvir o barulho de trovão do motor de sua picape ao longe. Inclinei-me ao lado do carro para esperar. Alice esperou comigo, enquanto os outros foram direto para suas aulas. Estavam entediados com minha fixação – era incompreensível para eles como qualquer humano pudesse despertar tanto interesse em mim por tanto tempo, não importava o quão delicioso o cheiro dela era.
A garota aos poucos entrou em meu campo de visão, seus olhos na estrada e suas mãos segurando com força o volante. Ela parecia ansiosa com algo. Levei um segundo para entender o que o algo seria, para perceber que todo humano tinha a mesma expressão hoje. Ah, a estrada estava escorregadia por causa do gelo, e eles estavam todos dirigindo com cuidado. Eu podia ver que ela levava o risco a sério.
Aquilo parecia alinhado com o pouco que eu já aprendera sobre sua personalidade. Adicionei aquilo à pequena lista: ela era uma pessoa séria, responsável.
Ela estacionou não muito longe de mim, mas ainda não notara minha presença ainda, encarando-a. Pensei no que ela faria quando percebesse? Coraria e iria embora?
Aquele era meu primeiro palpite. Mas talvez ela me encarasse de volta. Talvez ela viesse falar comigo.
Inspirei fundo, enchendo meus pulmões. Esperançoso, apenas por precaução.
Ela saiu da picape com cuidado, testando o chão escorregadio antes que ela pusesse todo seu peso nele. Não olhou para cima, e isso me frustrou. Talvez eu devesse falar com ela…
Não, isso seria errado.
Ao invés de virar em direção ao colégio, ela caminhou até a traseira da picape, segurando-se no lado da picape de um jeito atrapalhado, não confiando em seus passos. Isso me fez sorrir, e eu senti os olhos de Alice em meu rosto. Não ouvi seja lá o que isso a fez pensar – eu estava me divertindo muito observando a garota checar as correntes nos pneus. Ela realmente parecia que estava prestes a escorregar, da maneira que seus pés deslizavam no chão. Ninguém mais parecia ter o mesmo problema – teria ela estacionado na pior parte do gelo?
Ela parou por um momento, olhando para os pneus com uma expressão estranha no rosto. Era… ternura? Como se algo com relação aos pneus a deixasse… emocionada?
Novamente, a curiosidade doeu como a sede. Era como se eu precisasse saber o que ela estava pensando – como se mais nada importasse.
Eu iria falar com ela. Ela parecia que precisava de uma ajuda de qualquer modo, pelo menos até que ela estivesse fora da zona escorregadia de gelo. Claro, eu não poderia lhe oferecer ajuda, não é? Hesitei, dividido. Por mais contrária que ela parecia com relação à neve, dificilmente ela acharia agradável o toque de minhas mãos brancas e frias. Eu devia ter usado luvas -
“NÃO!” Alice ofegou alto.
Instantaneamente, li seus pensamentos, imaginando primeiro que eu deveria ter feito uma escolha ruim e ela me viu fazendo algo imperdoável. Mas não era nada a ver comigo.
Tyler Crowley escolhera fazer a curva do estacionamento rápido demais. Essa escolha o faria deslizar no gelo…
A visão aconteceu a menos de meio segundo da realidade. A van de Tyler rodou na esquina enquanto eu assistia o final que deixou Alice sem fôlego.
Não, essa visão não tinha nada a ver comigo, mas ainda assim tinha tudo a ver comigo, porque a van de Tyler – os pneus agora tocando o gelo num ângulo pior, impossível – ia rodar pelo estacionamento e bater na garota que se tornara o foco não intencional de meu mundo.
Mesmo sem Alice prevendo, teria sido fácil adivinhar a trajetória do veículo, saindo do controle de Tyler.
A garota, parada no lugar exatamente errado na traseira da picape, olhou para cima, confusa com o barulho dos pneus cantando no asfalto. Ela olhou diretamente nos meus olhos horrorizados, e virou-se para observar sua morte iminente.
Ela, não! As palavras gritaram em minha mente, como se pertencessem a outra pessoa.
Ainda preso aos pensamentos de Alice, percebi que a visão de repente se modificava, mas não tive tempo de ver o que aconteceria então.
Atirei-me pelo estacionamento, jogando-me entre a van desgovernada e a garota petrificada. Movimentei-me tão depressa que tudo parecia apenas um borrão, menos o objeto em que eu estava focado. Ela não me viu – nenhum olho humano conseguiria acompanhar minha movimentação – ainda encarando a forma que estava prestes a prensá-la na estrutura metálica de sua picape.
A peguei pela cintura, movendo com urgência para ser tão gentil quanto fosse possível. No centésimo de segundo entre o tempo que levei para tirá-la do caminho da morte e o tempo que levei para cair no chão com ela em meus braços, eu estava vividamente consciente da fragilidade de seu corpo.
Quando ouvi sua cabeça bater contra o gelo, senti como se eu tivesse virado gelo também.
Mas eu não tinha nem mesmo um segundo inteiro para me certificar de sua condição. Escutei a van atrás de nós, girando barulhenta enquanto batia no corpo metálico da picape da garota. Estava mudando de curso, virando-se, vindo até ela novamente – como se ela fosse um ímã, puxando-a para nós.
“Droga,” sibilei.
Eu já havia feito muito. Enquanto eu voava pelo ar para tirá-la do caminho, eu estava consciente do erro que estava cometendo. Saber que era um erro não me impediu, mas eu não estava alheio ao risco que estava assumindo – assumindo, não apenas para mim, mas para toda minha família.
Revelação.
E isso certamente não ajudaria, mas não havia a menor chance de eu deixar a van obter sucesso em sua segunda tentativa de tirar a vida da garota.
A deixei no chão e ergui minhas mãos, segurando a van antes que ela pudesse tocar a garota. A força do movimento me lançou de encontro ao carro parado ao lado da picape, e eu podia sentir sua forma afundar por meus ombros. A van tremeu contra o obstáculo que eram meus braços, e então girou, balançando instável nos dois pneus mais afastados.
Se eu movesse minhas mãos, o pneu traseiro da van ia cair nas pernas dela.
Ah, pelo amor de tudo que é sagrado, as catástrofes nunca teriam fim? Havia mais alguma coisa pra dar errado? Eu não podia ficar ali, segurando a van no ar, e esperando por resgate. Mas não podia jogar a van longe – havia o motorista a considerar, seus pensamentos incoerentes pelo pânico.
Com um rugido interno, empurrei a van para que ela se afastasse de nós por um instante. Enquanto ela balançava novamente em minha direção, a segurei por debaixo de sua forma com minha mão direita enquanto enrolava meu braço esquerdo em volta da cintura da garota novamente e a arrastava de debaixo da van, puxando-a apertada a meu lado. Seu corpo se moveu mole enquanto eu a virava para que suas pernas estivessem livres – estaria ela consciente? Quanto dano eu a teria infligido em minha desastrosa tentativa de resgate?
Deixei a van cair, agora que não podia mais machucá-la. Ela bateu no pavimento, as janelas tremendo em uníssono.
Eu sabia que estava no meio de uma crise. O quanto ela teria visto? Mais alguém teria me visto materializar ao lado dela e então segurado a van enquanto tentava tirar a garota de debaixo dela? Essas questões deveriam ser minha maior preocupação.
Mas eu estava ansioso demais para realmente me importar com a ameaça de exposição o tanto que eu deveria. Muito tomado pelo pânico de que eu poderia tê-la machucado em meu esforço de protegê-la. Muito assustado de tê-la tão próxima a mim, sabendo que assim eu sentiria seu cheiro se eu me permitisse respirar. Muito consciente do calor de seu corpo macio, pressionado ao meu – mesmo pelo obstáculo duplo de nossas jaquetas, eu podia sentir o calor…
O primeiro medo foi o maior. Quando os gritos das testemunhas se ergueu a nossa volta, me inclinei para examinar seu rosto, para ver se ela estava consciente – esperando ansiosamente para que ela não estivesse sangrando.
Seus olhos estavam abertos, encarando em choque.
“Bella?” Perguntei urgentemente. “Você esta bem?”
“Estou bem.” Ela disse, suas palavras soaram automáticas com tom atordoado.
Alívio. Era tão esquisito quanto doloroso, o banho que veio a mim com o som da sua voz. Eu inspirei um pouco entre meus dentes, e não me importei com a  queimação que estava na minha garganta. Eu quase dei as boas-vindas.
Ela se esforçou para sentar-se, mas eu não estava pronto para soltá-la. Se eu soltasse… seria mais seguro? Melhor, no mínimo, tê-la enroscada em mim.
“Cuidado,” Eu a avisei. “Acho que você bateu sua cabeça com força.”
Não estava cheirando a sangue novo – uma piedade – mas isso não quer dizer nada sobre o dano interno. Eu estava inesperadamente ansioso para levá-la ao Carlisle e ao seu completo equipamento de radiologia.
“Ai,” ela disse, seu tom comicamente chocado quando ela percebeu que eu estava certo sobre sua cabeça.
“Foi isso que pensei”. Aliviadamente foi engraçado para mim, me fez ficar mais tonto.
“Como foi que…” Sua voz falhou, e seus olhos tremeram. “Como foi que chegou aqui tão rápido?”
O alivio voltou azedo, o humor desapareceu. Ela percebeu demais.
Agora pareceu que a garota estava em postura séria, a ansiedade pela minha família estava séria.
“Eu estava bem ao seu lado, Bella.” Eu sabia por experiência que se eu tivesse muita auto-confiança poderia mentir, de uma maneira que qualquer questionamento poderia parecer verdade.
Ela esforçou-se para se mover de novo, e nessa hora eu me permiti. Eu precisava respirar tanto que eu poderia fazer meu papel corretamente, eu precisava de espaço do seu corpo caloroso, delicioso e quente tanto que não poderia combinar com sua mensagem de desespero para mim. Eu deslizei para longe dela, o mais longe o possível no pequeno espaço entre os destroços do veículo.
Ela me olhou e eu a olhei também. Para olhar para longe, seria um primeiro erro que apenas um mentiroso incompetente poderia fazer, e eu não era um mentiroso incompetente. Minha expressão estava suave, benigna… Seu rosto pareceu confuso. Isso era bom.
A cena do acidente estava cercada agora. Tantos estudandes, crianças, colegas se empurrando feito manivelas para ver qualquer corpo que fosse visivel. Ali as falas eram inteligíveis com os altos gritos dos pensamentos chocados. Eu escaniei os pensamentos uma vez para ter certeza que não havia ninguém desconfiado ainda, e então pude desligar e me concentrar apenas na garota.
Ela estava distraída por causa da confusão. Ela deu uma olhada por perto, sua expressão continuou chocada e cansada para se manter em pé.
Eu coloquei minha mão levemente para empura-la.
“Fique quieta por enquanto.” Ela parecia bem, mas ela poderia mesmo mover seu pescoço? De novo, eu ansiei por Carlisle. Meus olhos como estudante teórico de medicina não se igualavam com seus séculos de medicina prática.
“Mas está frio,” Ela reclamou.
Ela quase tinha sido esmagada até a morte duas vezes de formas distintas e se ferido uma vez mais, e era esse frio que a estava incomodando. Um pedaço da memória deslizou em meus dentes, depois eu pude lembrar que a situação não foi engraçada.
Bella piscou, e seus olhos focaram no meu rosto. “Você estava lá.”
Aquilo soou sério para mim de novo.
Ela deu uma olhada para trás, viu que não tinha nada para ver além da Van amassada. “Você estava perto do seu carro.”
- Não estava não.
- Vi você. – ela insistiu; a voz dela era infantil quando era teimosa. Seu queixo sobressaiu.
- Bella, eu estava parado do seu lado e tirei você do caminho.
Eu encarei fundo em seus olhos intensos, tentando convencê-la a aceitar minha versão – a única racional disponível.
O queixo dela se endureceu. – Não.
Eu tentei ficar calmo, não entrar em pânico. Se eu pudesse a manter calada por alguns momentos, me dar uma chance de destruir a evidência… e negar a história dela alegando uma lesão na cabeça.
Não deveria ser fácil manter essa garota silenciosa e reservada calada? Se ela confiasse em mim, só por alguns instantes…
-Por favor, Bella. – eu disse, e minha voz estava muito intensa, porque de repente eu queria que ela confiasse em mim. Queria muito, e não só por causa do acidente. Que vontade estúpida. Que sentido faria ela confiar em mim?
- Por quê? – ela perguntou, ainda na defensiva.
- Confie em mim. – eu pedi.
- Promete que vai me explicar tudo depois?
Deixou-me nervoso ter que mentir para ela de novo, quando eu queria tanto que eu merecesse a confiança dela. Então, quando eu a respondi, retruquei.
- Tudo bem.
- Tudo bem. – ela revidou no mesmo tom.
Enquanto a tentativa de resgate começava ao nosso redor – adultos chegando, autoridades foram chamadas, sirenes à distância – eu tentei ignorar a garota e colocar minhas prioridades em ordem. Busquei em cada mente no estacionamento, das testemunhas e das que chegaram depois, mas não consegui achar nada de perigoso. Muitos estavam surpresos de me ver ao lado de Bella, mas todos concluíram – porque não havia mais nenhuma conclusão a se tirar – que eles não tinham me notado parado ao lado da menina antes do acidente.
Ela era a única que não aceitava a explicação mais fácil, mas também seria considerada a fonte menos confiável. Ela estava aterrorizada, traumatizada, para não falar a pancada na cabeça. Possivelmente em choque. Seria aceitável para a história dela estar confusa, certo? Ninguém a daria atenção com tantos outros expectadores.
Eu recuei quando ouvi os pensamentos de Rosalie, Jasper e Emmett, que chegavam agora na cena. Seria o inferno pagar por isto à noite…
Eu queria resolver o problema da fissura que meus ombros tinham deixado no carro caramelo, mas a garota estava perto demais. Teria que esperar até que ela estivesse distraída.
Era frustrante esperar – tantos olhos humanos em mim – enquanto os humanos lutavam com a van, tentando tirá-la de nós. Eu podia ter ajudado, apressado o processo, mas já estava com problemas suficientes e a menina tinha olhos atentos. Finalmente, eles conseguiram afastá-la longe o suficiente para que os paramédicos entrassem com as macas.
Um rosto grisalho e familiar apareceu.
- Oi, Edward.  – Brett Warner disse. Ele também era um enfermeiro registrado, e eu o conhecia bastante bem do hospital. Foi um golpe de sorte – a única sorte de hoje – foi ele quem chegou até nós primeiro. Em seus pensamentos, ele estava notando que eu parecia alerta e calmo. – Você está bem, garoto?
- Perfeito, Brett. Nada me acertou. Mas receio que a Bella aqui talvez tenha uma concussão. Ela bateu a cabeça forte quando a tirei da frente…
Brett se virou para a menina, que me lançou um olhar traído. Ah, estava certo. Ela era o tipo de mártir calado – preferia sofrer em silêncio.
Ela não contradisse minha história imediatamente e isso me deixou melhor.
O próximo paramédico insistiu que eu me deixasse ser tratado, mas não foi tão difícil desencorajá-lo. Eu prometi que deixaria meu pai me examinar, e ele desistiu. Com a maioria dos humanos, só falar com confiança era necessário. Com a maioria dos humanos, menos a menina, é claro. Ela se encaixava em algum padrão?
Quando eles colocaram o protetor de pescoço nela – e seu rosto ficou escarlate de vergonha – usei a distração para arrumar silenciosamente o formato do amassado no carro caramelo com meu pé. Só meus irmãos notaram o que eu estava fazendo e escutei a promessa mental de Emmett de arrumar o que eu deixasse para trás.
Agradecido pela ajuda dele – e mais agradecido que Emmett, pelo menos, já tinha perdoado minha escolha perigosa – fiquei mais relaxado quando subi no banco da frente da ambulância ao lado de Brett.
O chefe de polícia chegou antes que eles colocassem Bella no fundo da ambulância.
Embora os pensamentos do pai de Bella estivessem além das palavras, o pânico e a preocupação emanando da mente do homem como qualquer outro nos arredores. Ansiedade e culpa sem palavras, muito dos dois sentimentos, o lavou quando ele viu sua única filha na maca.
Lavaram dele e passaram para mim, ecoando e ficando mais forte. Quando Alice tinha me avisado que matar a filha de Charlie Sawn o mataria também, ela não estava exagerando.
Minha cabeça se curvou de culpa enquanto escutava sua voz em pânico.
- Bella! – ele gritou.
- Eu estou bem Char… pai. – ela suspirou. – Não há nada de errado comigo.
A garantia dela mal acalmou o terror dele. Ele se virou para o paramédico mais perto e pediu mais informação.
Não foi até eu o ouvir falando, formando frases perfeitamente coerentes tirando seu pânico que eu percebi que a ansiedade e preocupação dele não eram além das palavras. Eu só… não podia ouvir as palavras exatas.
Hmm. Charlie Swan não era tão silencioso como a filha, mas eu podia ver de onde ela tinha herdado. Interessante.
Nunca tinha passado muito tempo envolta do chefe de polícia da cidade. Sempre o considerei um homem de raciocínio lento – agora eu entendi que eu é que era lento. Os pensamentos dele eram parcialmente ocultos, não ausentes. Eu só podia escutar o caráter deles, o tom…
Queria escutar com mais atenção, ver se eu podia achar nessa nova pequena peça a chave para os segredos da garota. Mas Bella foi trancada na parte trazeira então, e a ambulância estava seguindo seu caminho.
Era difícil me desviar dessa possível solução para o mistério que tinha me deixado obcecado. Mas eu tinha que pensar agora – olhar o que havia sido feito hoje de cada ângulo. Eu tinha que escutar, ter certeza de que não tinha colocado todos nós em tanto perigo que teríamos que partir imediatamente. Tinha que me concentrar.
Não havia nada nos pensamentos dos paramédicos para me preocupar. Até onde eles sabiam, não tinha nada de errado com a garota. E Bella estava mantendo a história que eu tinha contado, até agora.
A prioridade, quando chegamos ao hospital, era ver Carlisle. Eu corri pelas portas automáticas, mas fui incapaz de abrir mão de assistir totalmente a Bella; continuei prestando atenção nela através dos pensamentos dos paramédicos.
Foi fácil achar a mente familiar de meu pai. Ele estava um seu escritório pequeno, sozinho – o segundo golpe de sorte desse dia azarado.
- Carlisle.
Ele escutou minha aproximação, e ficou alarmado assim que viu meu rosto. Ele ficou em pé, pálido como um fantasma. Ele se inclinou para frente da mesa de nogueira organizada.
Edward, você não…
- Não, não, não é isso.
Ele respirou fundo. Claro que não. Desculpe que pensei isso. Seus olhos, claro, eu devia reconhecido… Ele notou meus olhos ainda eram dourados com alívio.
- Mas ela está machucada, Carlisle, provavelmente não é grave, mas…
- O que aconteceu?
- Um acidente de carro estúpido. Ela estava no lugar errado, na hora errada. Mas eu não podia fica parado lá – deixar que fosse atropelada…
Comece de novo, eu não entendo. Como você se envolveu?
- Uma van derrapou no gelo. – eu sussurrei. Olhei a parede atrás dele enquanto falava. Ao invés de ser coberta com diplomas, ele tinha só uma pintura à óleo, uma de suas favoritas, um Hassam não descoberto. – Ela estava no caminho. Alice viu acontecendo, mas não havia tempo para fazer nada além de correr pelo estacionamento e tirá-la da frente. Ninguém notou… exceto ela. Eu tive que parar a van também, mas de novo, ninguém viu… a não ser ela. Eu… eu sinto muito, Carlsile. Não queria nos colocar em perigo.
Ele deu a volta na mesa e colocou a mão no meu ombro.
Você fez a coisa certa. E não deve ter sido fácil para você. Estou orgulhoso, Edward.
Eu o olhei nos olhos. – Ela sabe que tem algo… de errado comigo.
- Isso não importa. Se tivermos que ir embora, nós iremos. O que ela disse?
Balancei a cabeça, um pouco frustrado. – Nada, ainda.
Ainda?
- Ela concordou com a minha versão dos eventos… mas está esperando uma explicação.
Ele franziu a testa, pensando.
- Ela bateu a cabeça – bom, eu fiz isso. – continuei rapidamente. – Eu a bati contra o chão com bastante força. Ela parece bem, mas… não acho que será difícil desacreditá-la.
Senti-me rude só de dizer as palavras.
Carlisle ouviu o desgosto na minha voz. Talvez isso não seja necessário. Vamos ver o que acontece, está bem? Parece que tenho uma paciente para ver.
- Por favor. – eu disse. – Estou preocupado que a tenha machucado.
A expressão de Carslile se aliviou. Ele passou o dedo pelo cabelo, só alguns tons mais claro que seus olhos dourados, e riu.
Foi um dia interessante para você, não foi? Em sua mente, eu podia ver a ironia, e era engraçada – para ele, pelo menos. Uma inversão de papéis. Durante aquele momento curto e impensado em que corri pelo estacionamento congelado, eu tinha passado de assassino para protetor.
Eu ri com ele, lembrando de ter certeza de que Bella nunca precisaria de proteção de nada além de mim mesmo. Minha risada tinha um tom irritado porque, apesar da van, isso ainda era verdade.
Eu esperei no escritório de Carlsile – uma das horas mais compridas que já vivi – escutando o hospital cheio de pensamentos.
Tyler Crowley, o motorista da van, parecia estar mais machucado que Bella, e a atenção se voltou para ele enquanto ela esperava a sua vez de fazer o raio-X. Carlisle ficou nos fundos, confiando no diagnóstico dos residentes de que a garota só estava levemente machucada. Isso me deixou ansioso, mas sabia que ele tinha razão. Uma espiada no rosto dele e ela imediatamente se lembraria de mim, do fato que havia algo de errado com a minha família, e talvez isso a fizesse falar algo.
Ela certamente tinha um parceiro disposto o suficiente para conversar. Tyler estava consumido por culpa com o fato de quase tê-la matado, e não conseguia parar de falar sobre isso. Eu podia ver a expressão dela através dos olhos dele, e estava claro que ela queria que ele parasse. Como ele não via isso?
Houve um momento tenso para mim quando Tyler perguntou como ela tinha saído da frente.
Eu esperei, sem respirar, como ela hesitou.
- Hmmm… – ele a escutou falar. Então ela fez uma pausa tão longa que Tyler se perguntou se sua pergunta a tinha confundido. Finalmente, ela continuou. - Edward me puxou de lá.
Eu suspirei. Então minha respiração acelerou. Eu nunca a tinha ouvido falar meu nome antes. Gostei do som – mesmo só de escutar pelos pensamentos de Tyler. Queria escutar com meus próprios ouvidos…
- Edward Cullen. – ela disse, quando Tyler não entendeu de quem ela tinha falado. Encontrei-me na porta, a mão na maçaneta. O desejo de vê-la estava ficando mais forte. Eu tive que me lembrar de ter cuidado.
- Ele estava do meu lado.
- Cullen? – Hm. Que estranho. – Não o vi… - Podia ter jurado… – Caramba, acho que foi tudo tão rápido. Ele está bem?
- Acho que sim. Está em algum lugar por aqui, mas ninguém o obrigou a usar uma maca.
Eu vi o olhar pensativo no rosto dela, a suspeita ficando mais forte em seus olhos, mas essas pequenas mudanças de expressão foram perdidas em Tyler.
Ela é bonita, ele estava pensando, quase surpreso. Mesmo toda desarrumada. Não faz meu tipo, mas… devia convidá-la para sair. Compensar por hoje…
Então fui para o corredor, a meio caminho da sala de emergência, sem pensar por um segundo no que estava fazendo.
Por sorte, a enfermeira entrou na sala antes de mim – era a vez de Bella tirar o raio-X. Encostei-me à parede em um canto escuro e tentei me controlar enquanto ela era levada para longe.
Não importava que Tyler pensou que ela era bonita. Qualquer um notaria isso. Não havia razão para eu me sentir… Como eu me sentia? Aborrecido? Ou enfurecido estava mais perto a verdade? Isso não fazia nenhum sentido.
Eu fiquei onde eu estava o quanto eu pude, mas a impaciência me venceu e eu voltei pra sala de radiologia. Ela já tinha sido levada de volta ao pronto socorro, mas eu podia dar uma olhada em seus Raios-x enquanto a enfermeira não voltava.
Eu me senti mais calmo quando vi. Sua cabeça estava bem. Eu não a tinha machucado, não exatamente.
Carlisle me apanhou lá.
Você parece melhor, ele comentou.
Eu apenas olhei pra frente. Nós não estávamos sozinhos, os corredores cheios de ordenados e visitantes.
Ah, sim. Ele encravou seus raios-x a tábua iluminada, mas eu não precisava de uma segunda olhada. Eu vejo. Ela está absolutamente bem. Muito bem, Edward.
O som da aprovação de meu pai criou uma reação mista em mim. Eu estaria contente, exceto por saber que ele não aprovaria o que eu ia fazer agora. Ao menos, ele não aprovaria se soubesse de minhas reais motivações…
“Eu acho que vou conversar com ela – depois que ela ver você,” eu suspirei. “Aja naturalmente, como se nada tivesse acontecido. Esqueça isso.” Todas razões aceitáveis.
Carlisle acenou ausente, ainda olhando pros seus raios-x. “Boa idéia. Hmm.”
Eu olhei pra ver o que o tinha interessado.
Olhe todas as contusões cicatrizadas! Quantas vezes a mãe dela a derrubou?
Carlisle sorriu pra si mesmo por sua brincadeira.
“Eu estou começando a pensar que essa garota tem apenas má sorte. Sempre no lugar errado na hora errada.”
Forks é certamente o lugar errado pra ela, com você aqui.
Eu me retirei.
Vá em frente. Esqueça essas coisas. Eu estarei com você logo.
Eu saí rapidamente, me sentindo culpado. Talvez eu fosse um mentiroso muito bom, se eu pudesse enganar Carlisle.
Quando eu cheguei ao pronto socorro, Tyler estava resmungando sob sua respiração, ainda se desculpando. A garota estava tentando escapar do remorso dele tentando dormir. Os olhos dela estavam fechados, mas sua respiração não estava contínua, e uma vez ou outra seus dedos se torciam impacientemente.
Eu encarei seu rosto por um longo tempo. Essa era a última vez que eu a veria. Isso disparou uma dor aguda em meu peito. Seria porque eu odiava deixar qualquer quebra-cabeça sem solução? Isso não parecia uma explicação suficiente.
Finalmente, eu respirei fundo e fiquei a vista.
Quando Tyler me viu, ele começou a falar, mas eu coloquei um dedo em meus lábios.
“Ela está dormindo?” Eu murmurei.
Os olhos de Bella se abriram rapidamente e focou em meu rosto. Eles se arregalaram por um momento, e depois se estreitaram por raiva ou suspeita. Eu lembrei que eu tinha uma encenação pela frente, então eu sorri pra ela como se nada incomum houvesse acontecido esta manhã – apenas uma pancada na cabeça e um pouco de imaginação livre.
“Hey, Edward,” Tyler disse. “Eu lamento muito -”
Eu levantei uma mão pra parar suas desculpas. “Sem sangue, sem danos,” eu disse humoradamente. Sem pensar, eu sorri muito largamente por minha brincadeira particular.
Era assustadoramente fácil ignorar Tyler, deitado não mais que 1.20m de mim, coberto de sangue fresco. Eu nunca tinha entendido como Carlisle era capaz de fazer aquilo – ignorar o sangue de seus pacientes pra cuidar deles. Não seria a constante tentação muito distraída, muito perigosa…? Mas, agora… Eu podia ver como, se você estivesse focado o suficiente em algo mais forte o suficiente, a tentação não seria nada demais.
Apesar de fresco e exposto, o sangue de Tyler não tinha nada a ver com o de Bella.
Eu mantive minha distância dela, me sentando nos pés do colchão de Tyler.
“Então, qual o veredicto?” eu perguntei a ela.
Ela fez bico. “Não há nada de errado comigo, mas eles não vão me deixar ir. Como você não está acorrentado a uma maca como o resto de nós?”
Sua impaciência me fez sorrir novamente.
Eu podia ouvir Carlisle no corredor agora.
“Tudo depende dos seus contatos,” eu disse suavemente. “Mas não se preocupe, eu vim libertar você.”
Eu assisti sua reação cuidadosamente enquanto meu pai entrava na sala. Os olhos dela se arregalaram e sua boca realmente abriu em surpresa. Eu gemi internamente. Sim, ela certamente tinha notado a semelhança.
“Então, Srta. Swan, como você está se sentindo?” Carlisle perguntou. Ele tinha uma maneira maravilhosamente calma que deixava a maioria dos pacientes bem em poucos momentos. Eu não poderia falar como isso afetou Bella.
“Eu estou bem,” ela disse quietamente.
Carlisle fixou seus raios-x no painel de luz acima da cama. “Seu raio-X parece bom. Sua cabeça está doendo? Edward disse que você bateu com força.”
Ela suspirou, e disse, “Eu estou bem,” novamente, mas dessa vez a impaciência vazou em sua voz. Depois ela olhou de relance em minha direção.
Carlisle se aproximou dela e correu seus dedos levemente por seu crânio até que ele encontrou o galo embaixo de sua cabeça.
Eu fui pego de surpresa pela onda de emoção que passou por mim.
Eu tinha visto Carlisle trabalhar com humanos mil vezes. Anos atrás, eu tinha até o ajudado informalmente – embora apenas em situações em que sangue não estava envolvido. Então não era uma coisa nova pra mim, assisti-lo interagir com a garota como se ele fosse tão humano quanto ela. Eu tinha invejado seu controle muitas vezes, mas não era o mesmo que essa emoção. Eu invejei mais que seu controle. Eu sofri pela diferença entre Carlisle e eu – que ele pudesse tocá-la tão gentilmente, sem receio, sabendo que nunca a machucaria…
Ela estremeceu, e eu pulei do meu assento.  Eu tive que me concentrar por um momento para manter minha postura relaxada.
“Sensível ?” Carlisle perguntou.
Seu queixo se levantou um pouco. “Na verdade não,” ela disse.
Outro pequeno pedaço de sua personagem se encaixou: ela estava brava. Ela não gostava de mostrar fraqueza.
Possivelmente a criatura mais vulnerável que eu já vi, e ela não quer parecer fraca. Uma gargalhada escorregou através de meus lábios.
Ela me olhou novamente.
“Bem,” Carlisle disse. “Seu pai está na sala de espera – você pode ir pra casa com ele agora. Mas volte se tiver vertigens ou qualquer problema com a sua visão.”
O pai dela estava aqui? Eu varri os pensamentos da sala de espera lotada, mas não conseguia distinguir sua voz mental do grupo antes que ela estivesse falando de novo, o rosto ansioso.
- Posso voltar pra a escola?
- Talvez devesse descansar hoje. – Carlisle sugeriu.
Os olhos dela se voltaram para mim. – Ele vai para a escola?
Agir normalmente… acalmar as coisas… esquecer a sensação quando ela me olha nos olhos…
-Alguém tem que espalhar a boa notícia de que sobrevivemos. – eu disse.
- Na verdade – Carlisle corrigiu – a maior parte da escola parece estar na sala de espera.
Eu pressenti a reação dela dessa vez – sua aversão à atenção. Ela não me desapontou.
- Ah, não – ela lamentou e colocou as mãos no rosto.
Eu gostei que finalmente adivinhei uma coisa certa. Estava começando a entendê-la…
- Quer ficar aqui? – Carlisle perguntou.
- Não, não! – ela disse rapidamente, girando as pernas sob o colchão e escorregando para ficar em pé. Ela tropeçou, sem equilíbrio, nos braços de Carlisle. Ele a pegou e a firmou.
Novamente, a inveja me inundou.
- Estou bem. – ela disse antes que ele pudesse comentar, um rosa claro em suas bochechas.
Claro, aquilo não incomodaria Carlisle. Ele teve certeza que ela tinha recuperado o equilíbrio e soltou as mãos.
- Tome um Tylenol para a dor. – ele instruiu.
- Não está doendo tanto assim.
Carlisle sorriu e assinou o prontuário dela. – Parece que vocês dois tiveram muita sorte.
Ela virou levemente o rosto, para me encarar com olhos rígidos. – A sorte foi Edward por acaso estar parado ao meu lado.
- Ah, bem, sim. – Carlisle concordou depressa, escutando a mesma coisa na voz dela que eu escutei. Ela não tinha pensado que suas suspeitas eram coisas da sua imaginação. Ainda não.
Toda sua, Carlisle pensou. Cuide do jeito que achar melhor.
- Muito obrigado. – eu sussurrei, rápido e baixo. Nenhum humano me ouviu. Os lábios de Carlisle se viraram um pouco para cima com o meu sarcasmo enquanto ele se virava para Tyler. – Mas acho que você terá que ficar conosco por mais um tempinho. – ele disse quando começou a examinar os cortes deixados pelo vidro quebrado.
Bom, eu tinha feito o estrago, então era justo que eu tivesse que lidar com ele.
Bella andou deliberadamente na minha direção, sem parar até que estivesse a uma distância desconfortável. Lembrei como eu tinha desejado, antes de todo o estrago, que ela se aproximasse de mim… Isso já era zombar desse desejo.
- Posso conversar com você um minuto? – ela sibilou para mim.
A sua respiração quente tocou meu rosto e eu tive que dar um passo para trás. A atração dela não tinha diminuído nem um pouquinho. Toda vez que ela estava perto de mim, despertava os meus piores instintos, os mais urgentes. Veneno inundou minha boca e meu corpo ansiou para atacar – para puxá-la para os meus braços e despedaçar sua garganta nos meus dentes.
Minha mente era mais forte que meu corpo, mas era por pouco.
- Seu pai está esperando por você. – eu a lembrei, com o queixo apertado.
Ela olhou para Carlisle e Tyler. Tyler não estava prestando nem um pouco de atenção, mas Carlisle estava monitorando cada respiração que eu dava.
Cuidado, Edward.
- Gostaria de falar com você a sós, se não se importa. – ela insistiu em uma voz baixa.
Eu gostaria de dizer que me importava muito, mas sabia que teria que passar por isso uma hora. Melhor acabar com isso de uma vez.
Estava cheio de tantas emoções em conflito quando eu saía do quarto, escutando-a tropeçar nos próprios pés atrás de mim, tentando me acompanhar.
Tinha que atuar. Sabia que papel eu faria – eu já tinha escolhido o personagem. Seria o vilão. Mentiria, ridicularizaria e seria cruel.
Isso era contra todos os meus melhores impulsos – os impulsos humanos aos quais tinha me agarrado todos esses anos. Nunca quis merecer mais confiança do que nesse momento, quando tinha que destruir qualquer possibilidade que ela existisse.
Foi pior saber que essa seria a última memória que ela teria de mim. Essa era a cena de despedida.
Virei-me para ela.
- O que você quer? – perguntei friamente.
Ela se contraiu um pouco com a minha hostilidade. Seus olhos ficaram confusos, na expressão que tinha me assombrado…
- Você me deve uma explicação. – ela disse em uma voz fraca; o rosto de marfim empalideceu.
Foi muito difícil manter minha voz dura. – Eu salvei a sua vida… Não lhe devo nada.
Ela recuou – queimou como ácido ver que minhas palavras a machucavam.
- Você prometeu. – ela sussurrou.
- Bella, você bateu a cabeça, não sabe do que está falando.
Então ela se empertigou. – Não há nada de errado com a minha cabeça.
Ela estava irritada agora, e isso deixou as coisas mais fáceis para mim. Eu sustentei seu olhar, deixando meu rosto menos amigável.
- O que você quer de mim, Bella?
- Quero saber a verdade. Quero saber por que estou mentindo por você.
O que ela queria era justo – me frustrou ter que negar isto para ela.
- O que você acha que aconteceu? – eu quase rosnei para ela.
Suas próximas palavras vieram em uma corrente. – Só o que eu sei é que você não estava em nenhum lugar perto de mim… O Tyler também não o viu, então não venha me dizer que bati a cabeça com força… Aquela van ia atropelar nós dois… E não aconteceu, e suas mãos pareceram amassar a lateral dela… E você deixou um amassado no outro carro e não está nada machucado… E a van devia ter esmagado minhas pernas, mas você a levantou… – De repente, ela trincou os dentes e seus olhos estavam brilhando com lágrimas não derramadas.
Eu a encarei, minha expressão de escárnio, embora o que sentisse mesmo era medo; ela realmente tinha visto tudo.
- Acha que eu levantei a van? – eu perguntei sarcasticamente.
Ela respondeu com um aceno rápido.
Minha voz ficou ainda mais irônica. – Sabe que ninguém vai acreditar nisso.
Ela lutou para controlar a raiva. Quando me respondeu, ela falou cada palavra devagar. – Não vou contar a ninguém.
Ela estava dizendo a verdade – Eu podia ver isso nos olhos dela. Mesmo furiosos e traídos, ela iria guardar meu segredo.
Por quê?
O choque disso arruinou a minha expressão cuidadosamente projetada durante meio segundo, e logo me recompus.
“E por que isso importa?” Eu perguntei, trabalhando para manter minha voz severa.
“Importa pra mim,” ela disse intensa. “Eu não gosto de mentir – então é melhor que tenha um bom motivo para fazer isso.”
Ela me pediu para confiar nela. Exatamente como eu queria que ela confiasse em mim. Mas esse lado da linha eu não podia atravessar.
A minha voz ficou calosa. “Você não pode só me agradecer e esquecer isso?”
“Obrigada,” ela disse, e logo ela fumigou silenciosamente, esperando.
“Você não vai esquecer isso, vai?”
“Não.”
“Nesse caso…” Eu não podia dizer ela a verdade se eu quisesse… E eu não podia querer.
Eu deixaria ela fazer sua própria história sobre quem eu era,  por que nada podia ser pior que a verdade – Eu estava vivendo um pesadelo,  diretamente das páginas de uma história de terror.
“Espero que você goste da decepção.”
Fizemos carranca um para o outro.
Foi ímpar quão amável sua raiva foi. Como um furioso gatinho, macio e inofensivo, e também ignorante quanto a sua própria invulnerabilidade.
Ela ficou rosada e apertou seus dentes de novo. “Por que você se deu o trabalho então?”
Sua pergunta não era a que eu estava esperando ou preparado para responder.
Eu perdi as regras do jogo, as quais eu estava firmado. Eu senti a máscara escorregar da minha face, e eu disse a ela – nesse único momento – a verdade.
“Eu não sei.”
Eu memorizei seu rosto uma última vez – ainda tinha alguns traços de raiva, o sangue ainda não tinha parado de deixar suas bochechas rosadas – e então eu me virei e andei para longe dela.

4. Visões

 
Eu voltei para a escola. Esta era a coisa certa a se fazer, a maneira mais discreta para se comportar.
No final do dia, quase todos os outros alunos tinham voltado para as classes também. Só Tyler e Bella e alguns outros – que provavelmente estavam usando o acidente como uma chance para matar aula – continuaram ausentes.
Não deveria ser tão difícil fazer a coisa certa. Mas, durante toda a tarde, estava batendo os dentes contra o desejo que me deixara querendo matar aula também – ir procurar a garota de novo.
Como um perseguidor. Um perseguidor obsessivo. Um vampiro perseguidor obsessivo.
A escola hoje estava – de algum modo, impossivelmente ainda mais tediosa do que tinha sido há uma semana. Como coma. Era como se as cores tivessem sido drenadas dos tijolos, das árvores, do céu, dos rostos ao meu redor.
Havia outra coisa certa que eu deveria estar fazendo… e não estava. Claro, também era uma coisa errada. Tudo dependia da perspectiva que você olhava.
Da perspectiva de um Cullen – não só um vampiro, mas um Cullen, alguém que pertencia a uma família, uma coisa tão rara em nosso mundo – a coisa certa a se fazer seria algo assim:
- Estou surpreso de vê-lo na classe, Edward. Eu ouvi que você esteve envolvido naquele acidente horrível hoje de manhã.
- Sim, eu estava, Sr. Banner, mas eu fui o sortudo. – Um sorriso amigável. – Eu não me machuquei nem um pouco… gostaria de poder dizer o mesmo por Tyler e Bella.
- Como eles estão?
- Eu acho que Tyler está bem… só alguns arranhões superficiais do vidro do pára-brisas. Embora não tenho certeza quando a Bella. – Uma careta preocupada. – Ela talvez tenha uma concussão. Eu escutei que ela estava bastante incoerente por um tempo – até vendo coisas. Eu sei que os médicos estavam preocupados…
 
Era assim que deveria ter sido. Era assim que eu devia à minha família.
- Estou surpreso em vê-lo na classe, Edward. Eu ouvi que você esteve envolvido naquele acidente horrível hoje de manhã.
- Não me machuquei. – Sem sorriso.
O Sr. Banner mudou seu peso de um pé para o outro, desconfortável.
- Tem alguma idéia de como Tyler Crowley e Bella Swan estão? Ouvi que tiveram alguns machucados…
Dei de ombros. – Não sei dizer.
O Sr. Banner limpou a garganta. – Ah, certo… – ele disse, meu olhar frio deixando sua voz um pouco tensa.
Ele andou rapidamente de volta para frente da sala e começou a matéria.
Era a coisa errada a se fazer. A não ser que você olhasse de uma perspectiva mais obscura.
Só que parecia tão… tão deselegante caluniar a garota pelas costas, especialmente quando ela estava provando ser mais confiável do que eu podia ter sonhado. Ela não havia dito nada para me trair, embora tivesse uma boa razão para o fazer. Eu iria traí-la quando ela não tinha feito nada a não ser guardar meu segredo?
Eu tive uma conversa quase idêntica com a Sra. Goff – só que em espanhol ao invés de inglês – e Emmett me olhou por um longo tempo.
Eu espero que você tenha uma boa explicação para o que aconteceu hoje. Rose está em pé de guerra.
Eu revirei meus olhos sem olhar para ele.
Na verdade eu tinha criado uma explicação que parecia perfeita. Supondo que eu não tivesse feito nada para parar a van antes que ela esmagasse a menina… eu tremi com esse pensamento. Mas se ela tivesse sido atingida, se ela tivesse sido ferida e tivesse sangrado, o fluído vermelho derramado, desperdiçado no asfalto, o cheiro de sangue fresco pulsando pelo ar…
Eu tremi de novo, mas não só em terror. Parte de mim tremeu de desejo. Não, eu não teria sido capaz de assistí-la sangrando sem expor a nós todos em um jeito muito mais escandaloso e chocante.
Parecia a desculpa perfeita… mas eu não a usaria. Era vergonhosa demais.
E de qualquer maneira, eu não tinha pensando nela até bem depois do fato ter ocorrido.
Tome cuidado com Jasper, Emmett continuou, alheio aos meus pensamentos. Ele não está tão nervoso… mas ele está mais decidido.
Eu vi o que ele quis dizer, e por um momento a sala girou ao meu redor. Meu ódio era tão devorador que uma névoa vermelha encobriu minha visão. Eu pensei que fosse me fogar nela.
CREDO, EDWARD! SE CONTROLE! Emmett gritou para mim em sua cabeça. Sua mão desceu para o meu ombro, segurando-me em meu lugar antes que eu pudesse pular e ficar em pé. Ele raramente usava sua força completa – raramente havia necessidade, porque ele era tão mais forte que qualquer outro vampiro que qualquer um de nós já tivesse encontrado – mas ele a usou agora. Ele agarrou meu braço, ao invés de me empurrar para baixo. Se ele estivesse me empurrando, a cadeira embaixo de mim teria desmoronado.
CALMA! Ele ordenou.
Eu tentei me acalmar, mas era difícil. A fúria queimava em minha cabeça.
Jasper não vai fazer nada até todos nós conversarmos. Eu só achei que você devia saber a direção que ele está tomando.
Eu me concentrei em relaxar, e senti a mão de Emmett afrouxar.
Tente não chamar mais atenção. Você já está com problemas o suficiente do jeito que está.
Eu respirei fundo e Emmett me soltou.
Eu procurei através da sala por rotina, mas nosso confronto tinha sido tão curto e silencioso que só algumas pessoas sentadas atrás de Emmett tinham notado. Nenhuma delas sabia o que pensar disso, e elas esqueceram. Os Cullens eram aberrações – todos já sabiam disso.
Droga, garoto, você está horrível, Emmett acrescentou, seu tom simpático.
- Dane-se. – eu resmunguei entre dentes, e escutei sua risada baixa.
Emmett não guardava rancor, e eu provavelmente deveria estar mais agradecido por sua natureza de fácil convívio. Mas eu podia ver que as intenções de Jasper faziam sentido para Emmett, que ele estava considerando qual seria o melhor caminho a se tomar.
O ódio ferveu, mau sob controle. Sim, Emmett era mais forte do que eu, mas ele ainda não havia me derrubado em uma luta. Ele dizia que era porque eu trapaceava, mas escutar pensamentos era tão parte de mim quanto a força era dele. Nós lutávamos de igual para igual.
Uma luta? Era essa a direção que tudo tomava? Eu iria lutar contra a minha família por uma humana que eu mal conhecia?
Eu pensei sobre isso por um minuto, pensei na sensação do frágil corpo da garota nos meus braços contra Jasper, Rose e Emmett – sobrenaturalmente fortes e rápidos, máquinas de matar por natureza…
Sim, eu iria lutar por ela. Contra a minha família. Eu tremi.
Mas não era justo deixá-la desprotegida quando fui eu quem a colocou em perigo.
Eu não conseguiria ganhar sozinho, entretanto, não contra os três deles, e me perguntei quais seriam meus aliados.
Carlisle, certamente. Ele não iria lutar contra ninguém, mas ele seria contra os planos de Rose e Jasper. Talvez isso fosse tudo que eu precisasse. Eu iria ver…
Esme era incerta. Ela não ficaria contra mim também, e ela iria detestar discordar de Carlisle, mas ela iria ser a favor de qualquer plano que mantivesse sua família unida. Sua prioridade não seria o certo, e sim eu. Se Carlisle era a alma da família, Esme era o coração. Ele nos deu um líder que merecia ser acompanhado, ela transformou isso em um ato de amor. Todos nós nos amávamos – mesmo por baixo da fúria que eu sentia por Jasper e Rose no momento, mesmo planejando lutar contra eles para salvar a garota, eu sabia que eu os amava.
Alice… não fazia idéia. Provavelmente dependeria do que ela visse chegando. Ela ficaria do lado do vencedor, imaginei.
Então eu teria que fazer isso sem ajuda. Sozinho eu não era páreo para eles, mas eu não ia deixar a menina ser machucada por minha culpa. Isso talvez exigisse uma ação evasiva…
Minha raiva diminuiu um pouco com o súbito humor negro. Eu podia imaginar como a menina reagiria se eu a raptasse. É claro, eu raramente adivinhava suas reações – mas que outra reação ela poderia ter além de terror?
Não tinha certeza como cuidar disso – raptá-la. Não seria capaz de ficar perto dela por muito tempo. Talvez eu só a devolvesse à mãe. Mesmo isso seria repleto de perigo. Para ela.
E também para mim, eu percebi de repente. Se eu a matasse por acidente… eu não tinha certeza de quanta dor isso iria me causar, mas eu sabia que seria intensa e em várias formas.
O tempo passou rapidamente enquanto eu meditava sobre todas as complicações à minha frente: a discussão me esperando em casa, o conflito com a minha família, a distância que eu seria forçado a percorrer depois de tudo…
Bom, eu não podia mais reclamar que a vida fora da escola era monótona. A garota tinha mudado isso.
Emmett e eu andamos silenciosamente para o carro quando o sinal tocou. Ele estava preocupado comigo, e preocupado com Rosalie. Ele sabia que lado teria que escolher em uma disputa, e isso o incomodava.
Os outros estavam esperando por nós no carro, também silenciosos. Éramos um grupo bem quieto. Só eu conseguia escutar a gritaria.
Idiota! Lunático! Imbecil! Estúpido! Egoísta, tolo irresponsável! Rosalie mantinha uma linha constante de insultos a plenos pulmões. Ficou difícil ouvir os outros, mas eu a ignorei o melhor que eu pude.
Emmett estava certo sobre Jasper. Ele estava seguro de seu plano.
Alice estava transtornada, preocupada com Jasper, passando por imagens do futuro. Não importa por qual direção Jasper chegasse à garota, Alice sempre me via lá, o impedindo. Interessante… nem Rosalie ou Emmett estavam com ele nessas visões. Então Jasper planejava trabalhar sozinho. Isso deixaria as coisas eqilibradas.
Jasper era o melhor lutador, certamente o mais experiente entre nós: minha única vantagem consistia no fato de que eu podia escutar seus movimentos antes que ele os fizesse.
Eu nunca havia lutado mais que de brincadeira com Emmett ou Jasper – só passatempo.  Senti-me enjoado com o pensamento de realmente tentar machucar Jasper…
Não, não isso. Só impedi-lo. Isso era tudo.
Eu me concentrei em Alice, memorizando as diferentes formas de ataque de Jasper.
Quando eu fiz isso, as visões dela mudaram, se afastando mais e mais da casa dos Swan. Eu o estava parando antes…
Pare com isso Edward! Não pode acontecer desse jeito. Eu não vou deixar.
Eu não a respondi, só continuei olhando.
Ela começou a olhar mais para frente, para o campo nebuloso e incerto de possibilidades distantes. Tudo era sombrio e vago.
No caminho inteiro para casa, a atmosfera silenciosa não cedeu. Eu estacionei na grande garagem perto da casa; a Mercedes de Carlisle estava ali, perto do Jeep enorme de Emmett, o M3 de Rosalie e meu Vanquish. Fiquei contente que Carlisle já estava em casa – o silêncio terminaria de forma explosiva, e eu queria que ele estivesse perto quando isso acontecesse.
Fomos direto para a sala de jantar.
Essa sala nunca era, é claro, usada para o propósito para o qual fora construída. Mas era mobiliada com uma longa mesa oval de mogno cercada por cadeiras – éramos cautelosos em ter os acessórios para fingir. Carlisle gostava de usá-la como uma sala de conferência. Em um grupo com tantas personalidades fortes e distintas, às vezes era necessário discutir as coisas sentados, de um jeito calmo.
Eu tinha um pressentimento de que sentar não iria ajudar em muita coisa hoje.
Carlisle sentou em seu lugar habitual na ponta leste da mesa. Esme estava ao lado dele – eles deram as mãos em cima da mesa.
Os olhos de Esme estavam em mim, as profundezas douradas deles cheias de preocupação.
Fique. Foi seu único pensamento.
Eu queria poder sorrir para a mulher que era verdadeiramente uma mãe para mim, mas eu não tinha como assegurá-la agora.
Eu sentei do outro lado de Carlsile. Esme se virou ao redor dele para colocar sua mão livre no meu ombro. Ela não tinha idéia do que estava para começar, só estava se preocupando comigo.
Carlisle tinha uma noção melhor do que estava chegando. Seus lábios estavam apertados com força e sua testa estava enrugada. A expressão era muito velha para seu rosto jovem.
Quando todos os outros estavam sentados, eu pude ver as linhas serem desenhadas.
Rosalie sentou-se diretamente à frente de Carlisle, na outra ponta da grande mesa. Ela me encarou, nunca desviando o olhar.
Emmett sentou ao lado dela, seu rosto e sua mente amargos.
Jasper hesitou, então foi ficar em pé contra a parede atrás de Rosalie. Ele estava decidido, não importava o resultado dessa discussão. Meus dentes bateram.
Alice foi a última chegar, e seus olhos estavam concentrados em alguma coisa muito longe – o futuro, ainda muito incerto para que ela fizesse uso dele. Sem parecer pensar ela sentou perto de Esme. Ela esfregou a testa como se tivesse dor de cabeça. Jasper se contorceu preocupado e considerou se juntar a ela, mas manteve sua posição.
Eu respirei fundo. Eu tinha começado isso – devia falar primeiro.
- Me perdoem. – Eu disse, olhando primeiro para Rosalie, depois para Jasper e então Emmett. – Eu não tive a intenção de colocar nenhum de vocês em risco. Foi impensado,e eu assumo total responsabilidade pelo meu ato precipitado.
Rosalie me encarou malignamente. – O que vocês quer dizer, ‘assume total responsabilidade’? Você vai consertar?
- Não do jeito que você quer dizer. – Eu disse, tentando manter minha voz calma e equilibrada. – Estou disposto a ir embora agora, se isso deixa as coisas melhores. – Se eu acreditar que a garota ficará segura, se eu acreditar que nenhum de vocês irá tocá-la, eu emendei na minha cabeça.
- Não. – Esme murmurou. – Não, Edward.
Eu dei um tapinha em sua mão. – São só alguns anos.
- Esme está certa. – Emmett disse. – Você não pode ir a lugar algum agora. Isso seria o oposto de útil. Nós temos que saber o que as pessoas estão pensando agora mais do que nunca.
- Alice pegará qualquer coisa grave. – eu discordei.
Carlisle balançou a cabeça. – Eu acho que Emmett tem razão, Edward. Vai ser mais fácil a garota falar se você desaparecer. Ou todos nós vamos, ou ninguém vai.
- Ela não vai dizer nada. – eu insisti rapidamente. Rose estava processando uma explosão, e eu queria esse fato claro antes.
- Você não conhece a mente dela. – Carlisle me lembrou.
- Disso eu tenho certeza. Alice, me dê cobertura.
Alice me olhou cansativamente. – Não consigo ver o que vai acontecer se nós ignorarmos isso. Ela olhou de relance para Rose e Jasper.
Não, ela não conseguia ver esse futuro – não quando Rosalie e Jasper estavam tão decididos em não ignorar o acidente.
A palma de Rosalie bateu na mesa com um barulho alto. – Não podemos permitir que a humana tenha chance de dizer nada. Carlisle, você deve ver isso. Mesmo se decidirmos todos desaparecer, não é seguro deixar histórias para trás. Nós vivemos de um jeito tão diferente do resto do nosso tipo – você sabe que existem aqueles que iriam adorar uma desculpa para fazer acusações. Temos que ter mais cuidado que qualquer um!
-Já deixamos rumores para trás antes. – eu a lembrei.
- Só rumores e suspeitas, Edward. Não testemunhas oculares e evidências!
- Evidência! – eu zombei.
Mas Jasper estava concordando, seus olhos duros.
-Rose… – Carlisle começou.
- Me deixe terminar, Carlisle. Não precisa ser nada que chame atenção. A menina bateu a cabeça hoje. Então talvez aconteça de o machucado ser mais sério do que parecia. – Rosalie deu de ombros. – Todo mortal vai dormir com a chance de nunca mais acordar. Os outros iriam esperar que nós cuidássemos nós mesmos disso. Tecnicamente, isso seria trabalho de Edward, mas isto está obviamente além dele. Você sabe que sou capaz de me controlar. Eu não iria deixar nenhuma evidência para trás.
- Sim, Rosalie, todos nós sabemos a assassina eficiente que você é. – eu rosnei.
Ela sibilou para mim, furiosa.
- Edward, por favor. – Carlisle disse. Então se virou para Rosalie. – Rosalie, eu fui a favor em Rochester porque eu senti que você devia ter justiça. Os homens que você matou haviam lhe prejudicado monstruosamente. Essa não é a mesma situação. A garota Swan é uma inocente.
- Não é nada pessoal, Carlisle. – Rosalie disse pelos dentes. – É para proteger a todos nós.
Houve um breve silêncio enquanto Carlisle pensava em sua resposta. Quando ele concordou, os olhos de Rosalie brilharam. Ela devia saber melhor. Mesmo se eu não fosse capaz de ler os pensamentos dele, eu podia ter previsto suas próximas palavras. Carlisle nunca cedia.
- Eu sei que sua intenção é boa, Rosalie, mas… eu gostaria muito que nossa família fosse digna de ser protegida. Os ocasionais… acidentes ou lapsos de controle são uma parte lamentável de quem nós somos. – Era bem característico dele se incluir no plural, embora ele próprio nunca tivesse tido esse tipo de lapso. – Assassinar uma criança sem culpa a sangue frio é outra coisa completamente diferente. Eu acredito que o risco que ela apresenta, quer ela fale suas suspeitas ou não, não é nada muito grave. Se abrirmos exceções para nos proteger, estaremos arriscando algo muito mais importante. Nós arriscamos perder a essência de quem somos.
Controlei minha expressão com cuidado. Não faria bem algum sorrir agora. Ou aplaudir, como eu gostaria.
Rosalie olhou com uma cara feia. – É só ser responsável.
- É ser insensível. – Carlisle corrigiu gentilmente. – Toda vida é preciosa.
Rosalie suspirou pesadamente e seu lábio inferior fez um bico. Emmett deu um tapinha em seu ombro. – Vai ficar tudo bem, Rosalie. – ele encorajou com uma voz baixa.
- A pergunta – Carlisle continuou. – é se nós devemos nos mudar ou não?
- Não. – Rosalie lamentou. – Acabamos de nos fixar. Não quero começar o segundo ano de colegial outra vez!
- Você vai poder manter sua idade atual, claro. – disse Carlisle.
- E ter que mudar ainda mais cedo? – ela revidou.
Carlisle deu de ombros.
- Eu gosto daqui! Tem pouco sol, podemos ser quase normais.
- Bom, não precisamos decidir agora. Podemos esperar e ver se isso se torna uma necessidade. Edward confia no silêncio da menina Swan.
Rosalie bufou.
Mas eu não estava mais preocupado com Rosalie. Podia ver que ela concordaria com a decisão de Carlisle, não importa o quanto estivesse brava comigo. A conversa deles tinha se voltado para detalhes sem importância.
Jasper continuou determinado.
Eu entendi o motivo. Antes dele e Alice se conhecerem, ele vivia em uma zona de combate, um cenário de guerra impiedoso. Ele sabia as conseqüências de desprezar as regras – já havia visto os medonhos resultados com os próprios olhos.
Dizia muita coisa o fato de ele não ter tentando acalmar Rosalie com seus talentos extras, ou que agora não tentava incentivá-la. Ele se mantinha neutro na discussão – acima dela.
- Jasper. – eu disse.
Ele encontrou meus olhos, seu rosto inexpressível.
- Ela não vai pagar pelo meu erro. Não vou permitir.
- Ela tira proveito, então? Ela deveria ter morrido hoje, Edward. Eu só consertaria as coisas.
Eu falei de novo, enfatizando cada palavra. – Não vou permitir.
Ele ergueu as sobrancelhas. Não estava esperando isso – ele não imaginava que eu fosse impedi-lo.
Ele balançou a cabeça uma vez. – Não vou deixar Alice viver em perigo, mesmo que seja leve. Você não sente por ninguém o que eu sinto por ela, Edward, e você não viveu o que eu vivi, tendo visto minhas memórias ou não. Você não entende.
- Não estou discutindo isso, Jasper. Mas estou avisando que não vou deixar você machucar Isabella Swan.
Nos encaramos – sem raiva, e sim avaliando o oponente. Eu senti que ele verificava o ambiente ao meu redor, testando minha determinação.
- Jazz… -Alice disse, nos interrompendo.
Ele sustentou seu olhar mais um pouco, e então olhou para ela. – Não se incomode em dizer que você pode cuidar de si mesma, Alice. Eu já sei disso. Eu ainda tenho que…
- Não é isso que eu vou falar. – Alice interrompeu. – Eu ia pedir um favor para você.
Eu vi o que estava na mente dela e minha boca se abriu com uma arfada audível. Eu olhei para ela, chocado, só vagamente consciente de que todos tirando Alice e Jasper me observavam cuidadosamente.
- Eu sei que você me ama. Obrigada. Mas eu gostaria muito que você não tentasse matar Bella. Primeiro de tudo, Edward está falando sério e não quero vocês dois brigando. Segundo, ela é minha amiga. Pelo menos vai ser.
Estava nítido na mente dela: Alice, sorrindo, com seus braços gelados envolta dos braços quentes e frágeis da garota. E Bella estava sorrindo também, seu braço na cintura de Alice.
A visão era sólida como uma pedra; só o tempo era incerto.
- Mas, Alice… – Jasper ofegou. Não conseguia virar minha cabeça para olhar sua expressão. Não conseguia me desviar da imagem na cabeça de Alice para olhar para ele.
- Eu vou amá-la algum dia, Jazz. Vou ficar muito chateada com você se não deixá-la viver.
Eu ainda estava preso nos pensamentos de Alice. Eu vi o futuro brilhar enquanto a resolução de Jasper diminuía com o pedido inesperado dela.
- Ah… – Ela suspirou – a decisão dele tinha criado um novo futuro. – Vê? Bella não vai dizer nada. Não há com o que se preocupar.
O modo como ela disse o nome da menina… como se elas já fossem confidentes…
- Alice – eu engasguei. – O que… isso?
- Eu disse que uma mudança estava vindo. Eu não sei, Edward. – Mas ela apertou o queixo e eu podia ver que havia mais. Ela estava tentando não pensar nisso; de repente estava se concentrando muito em Jasper, embora ele estivesse muito espantado para fazer algum progresso com sua decisão.
Ela fazia isso às vezes, quando queria esconder algo de mim.
- O que é, Alice? O que está escondendo?
Ouvi Emmett resmungar. Ele sempre ficava frustrado quando Alice e eu tínhamos esses tipos de conversa.
Ela sacudiu a cabeça, tentando me manter fora.
-É sobre a garota? – eu ordenei. – É sobre Bella?
Ela bateu os dentes se concentrando, mas quando eu falei o nome de Bella, ela escorregou. Só durou meio segundo, mas foi o suficiente.
- NÃO! – eu gritei. Eu escutei a cadeira bater no chão e percebi que estava em pé.
- Edward! – Carlisle ficou em pé também, seu braço no meu ombro. Mal estava ciente dele.
- Está consolidando. – Alice sussurrou. – Cada minuto que passa você está mais decidido. Só existem duas saídas para ela agora. É uma coisa ou outra, Edward.
Eu podia ver o que ela via… mas não queria aceitar.
- Não. – eu disse de novo; não tinha volume na minha negação. Minhas pernas ficaram bambas e precisei me apoiar na mesa.
- Alguém por favor quer deixar o resto de nós saber do mistério? – Emmett reclamou.
- Eu tenho que ir embora. – eu sussurrei para Alice, ignorando-o.
- Edward, nós já falamos sobre isso. – Emmett disse alto. – Essa é a melhor maneira de fazer a garota falar. Além do mais, se você for embora, nós não vamos ter certeza se ela vai falar alguma coisa ou não. Você tem que ficar e lidar com isso.
- Não vejo você indo a lugar algum, Edward. – Alice me disse. – Não sei mais se você consegue ir embora. – Pense, ela acrescentou silenciosamente. Pense sobre partir.
Eu vi o que ela quis dizer. Sim, a idéia de nunca mais ver a menina era… dolorosa. Mas também era uma necessidade. Não conseguia aprovar nenhum dos futuros que aparentemente eu a tinha condenado.
Não tenho certeza absoluta quanto ao Jasper, Edward. Alice continuou. Se você partir, ele pensa que ela é um perigo para nós.
- Eu não vou ouvir isso. – eu a contradisse, ainda meio consciente da nossa platéia. Jasper estava hesitante. Ele não faria algo que magoasse Alice.
Não neste momento. Você arriscaria a vida dela, a deixaria desprotegida?
-Por que está fazendo isso comigo? – eu gemi. Minha cabeça caiu em minhas mãos.
Eu não era o protetor de Bella. Não podia ser isso. O futuro dividido de Alice não era prova suficiente disso?
Eu a amo também. Ou eu vou. Não é a mesma coisa, mas eu a quero por perto para isso.
- A ama também? – eu sussurrei, incrédulo.
Ela suspirou. Você é tão cego, Edward. Não consegue ver a direção que está tomando? Não consegue ver onde já está? É mais inevitável do que o sol nascendo no leste. Veja o que eu vejo…
Eu balancei minha cabeça, horrorizado. – Não. – eu tentei bloquear as visões que ela me revelada. – Não tenho que seguir esse caminho. Eu vou embora. Eu vou mudar o futuro.
- Você pode tentar… – ela disse, a voz cética.
- Ah, por favor! - Emmett aumentou o tom de voz.
- Preste atenção. – Rosalie sibilou para ele. – Alice o vê se apaixonando por uma humana! Isso é típico de Edward! – Ela tirou sarro.
Eu mal a ouvi.
- O quê? – Emmett disse, surpreso. Então sua risada de rugido ecoou pelo cômodo. – É isso o que tem acontecido? – Ele riu de novo. – Parada dura, Edward.
Eu senti a mão dele no meu ombro, e a afastei distraído. Não conseguia prestar atenção nele.
- Se apaixonando por uma humana? – Esme repetiu em uma voz impressionada. – Pela garota que ele salvou hoje? Se apaixonar por ela?
- O que você vê, Alice? Exatamente. – Jasper pediu.
Ela se virou para ele; Eu continuei a olhar seu rosto, entorpecido.
- Tudo depende se ele é forte o bastante ou não. Ou ele irá matá-la com as próprias mãos – ela girou para encontrar meu olhar outra vez – o que iria realmente me irritar, Edward, sem mencionar o que iria fazer com você – ela olhou Jasper novamente – ou ela vai ser uma de nós algum dia.
Alguém engasgou; não vi quem foi.
- Isso não vai acontecer! – eu estava gritando de novo. – Nenhum dos dois!
Alice não pareceu ter me escutado. – Tudo depende. – ela repetiu. – Talvez ele seja só forte o suficiente para não matá-la – mas vai ser por pouco. Vai requerer uma quantidade incrível de controle. – ela meditou. – Mais até o que Carlisle tem. Ele talvez seja forte o suficiente… A única coisa para qual ele não é forte o bastante é ficar longe dela. Essa é uma causa perdida.
Não conseguia achar minha voz. Ninguém parecia ser capaz de achar sua.  A sala ficou imóvel.
Eu encarei Alice, e todos me encararam. Podia ver minha própria expressão de terror de cinco pontos de vista diferentes.
Depois de um longo momento, Carlisle suspirou.
- Bom, isso… complica as coisas.
- Eu que o diga. – Emmett concordou. A voz dele era mais uma risada. Era com Emmett mesmo, fazer piada na destruição da minha vida.
- Mas acho que o plano continua o mesmo. – Carlisle disse, ponderado. – Vamos ficar e observar. Obviamente, ninguém irá… machucar a menina.
Eu enrijeci.
- Não. – Jasper disse calmamente. – Se Alice só vê duas saídas…
- Não! – minha voz não era um grito ou um rosnado ou choro de desespero, mas uma combinação dos três. – Não!
Eu tinha que ir embora, ficar longe do som dos pensamentos deles – da aversão egoísta de Rosalie, do humor de Emmett, da paciência infinita de Carlisle…
Pior: a confiança de Alice. A confiança de Jasper na confiança dela.
Pior de tudo: a… alegria de Esme.
Fui para fora da sala. Esme tocou meu braço quando eu passei, mas eu não reconheci o gesto.
Estava correndo antes que estivesse fora da casa. Passei pelo rio em um pulo, e corri para a floresta. A chuva tinha voltado, caindo tão pesada que eu me ensopei em poucos segundos. Gostei da água espessa – criou uma parede entre eu e o resto do mundo. Me rodeou, me deixou isolado.
Corri na direção leste, para longe das montanhas sem desviar da linha até que pude ver as luzes de Seattle do outro lado da baía. Parei antes que chegasse à fronteira da civilização.
Cercado pela chuva, sozinho, eu finalmente me obriguei a ver o que tinha feito – como tinha mutilado o futuro.
Primeiro, a visão de Alice e da garota com seus braços ao redor uma da outra – a confiança e amizade eram tão óbvias que gritavam da imagem. Os olhos castanhos expressivos de Bella não estavam confusos nessa visão, e sim cheios de segredos – nesse momento, pareciam segredos felizes. Ela não se afastou do braço frio de Alice.
O que isso significava? O quanto ela sabia? Nessa visão congelada do futuro, o que ela pensava de mim?
Então a outra imagem, tão parecida, só que colorida com horror. Alice e Bella, seus braços ainda envolta uma da outra em sua amizade confiável. Mas agora não havia diferença entre esses braços – os dois eram braços, macios e de mármore, duros como aço. Os olhos atentos de Bella não eram mais castanhos chocolate. Suas íris eram de um escarlate vívido, chocante. Os segredos neles eram insondáveis – aceitação ou angústia? Era impossível de dizer. O rosto dela era frio e imortal.
Eu tremi. Eu não conseguia evitar as perguntas similares, mas diferentes: O que isso significava – como isso aconteceu? E o que ela pensava de mim agora?
Eu podia responder essa última. Se eu a forçasse a fazer parte dessa meia vida vazia por causa da minha fraqueza e egoísmo, com certeza ela me odiaria.
Mas havia mais uma imagem horrorosa – pior do que qualquer outra que já tive.
Meus próprios olhos, escarlate intensos com o sangue humano, os olhos de um monstro. O corpo quebrado de Bella em meus braços, branco pálido, vazio, sem vida. Era tão concreta, tão clara.
Não podia suportar ver isso. Não conseguia suportar. Tentei tirar da minha mente, tentei ver alguma outra coisa, qualquer coisa. Tentei ver a expressão no rosto com vida dela que tinha obstruído minha visão no último capítulo de minha existência. Tudo em vão.
A visão negra de Alice encheu minha cabeça, e eu me contorci internamente com a agonia que ela causou. Enquanto isso, o monstro em mim estava cheio de felicidade, eufórico com as chances de seu sucesso. Deixou-me enjoado.
Isso não podia ser permitido. Tinha que ter um jeito de transformar o futuro. Eu não deixaria as visões de Alice me dizer o que fazer. Eu escolheria um caminho diferente. Sempre existia uma escolha.
Tinha que existir.